Para ministra, o maior desafio de prefeitos é criar aterros sanitários
Dois anos após a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), em agosto de 2010, estados e municípios ainda buscam formas de aplicação da lei que determina uma série de mudanças no manejo do lixo e do produto final após o consumo. Pelo texto, que demorou 20 anos para ser aprovado por deputados e senadores, empresas e prefeituras poderão ser punidas caso não respeitem o descarte correto do lixo. Os moradores das cidades também terão responsabilidades com a nova lei.
Em entrevista ao CORREIO, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, afirma que o grande desafio dos novos prefeitos baianos é acabar com os lixões. Na Bahia, existem pelo menos 305 lixões a céu aberto encontrados nos 240 municípios pesquisados pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedur). O estado conta apenas com 57 aterros sanitários, aponta ainda o estudo. O prazo determinado pela PNRS para o fim dos lixões termina em 2014, mas até agora 90% das prefeituras do estado ainda não entregaram nem o plano de gestão dos resíduos sólidos – o prazo era agosto de 2012. Por conta disso, não podem receber verba da União para manejo e administração do lixo.
Produtos como embalagens de agrotóxicos, lâmpadas, pilhas, baterias e eletrônicos não poderão ser descartados como lixos comuns. Pela regra conhecida como Logística Reversa, após o consumo, os vendedores e distribuidores deverão estabelecer pontos de coleta para devolução aos fabricantes. O destino desses produtos não poderá ser mais os lixões. Em seus lugares, precisam ser criados aterros sanitários, que reduzem o impacto dos resíduos sólidos no meio ambiente.
Participante ativa das discussões que levaram à aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, a ministra Izabella Teixeira disse que o governo federal investiu R$ 57 milhões, entre 2011 e 2012, para que municípios elaborassem seus planos de gestão dos resíduos. “Os gestores estaduais e municipais, em sua maioria, já adotam práticas que buscam a preservação do meio ambiente nas atividades de gestão. Então, a PNRS veio para estimular o avanço necessário ao país no enfrentamento dos principais problemas ambientais, sociais e econômicos decorrentes do manejo inadequado dos resíduos sólidos”, destaca por email.
A entrevista da ministra apresenta o tema Resíduos Sustentáveis, do seminário Desenvolvimento Sustentável, uma das quatro temáticas que serão debatidas pelo Fórum Agenda Bahia, de outubro a dezembro deste ano. O encontro vai debater os desafios e oportunidades que se criam no estado com a Política Nacional de Resíduos Sólidos.
A ministra aposta ainda na conscientização dos consumidores e na coleta seletiva para acelerar o cumprimento das metas de gestão correta dos resíduos.
A que a senhora credita a demora na aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos?
A demora ocorreu por conta de uma série de emendas recebidas ao longo dos anos e da falta de consenso entre representantes dos setores público e privado, por se tratar de um tema importante e complexo ao mesmo tempo.
O Aterro Sanitário Metropolitano recebe os resíduos sólidos de Salvador, Lauro de Freitas e Simões Filho
Qual principal marco da PNRS? Quais mudanças a nova lei provoca no entendimento sobre o manejo dos resíduos sólidos?
A PNRS instituiu alguns marcos importantes, o principal deles é a instituição da Responsabilidade Compartilhada pelo Ciclo de Vida dos Produtos. Antes da lei, produtores, importadores, distribuidores e comerciantes pensavam que sua respectiva responsabilidade terminava no momento da venda do produto ao consumidor, passando esta responsabilidade para o município, no momento seguinte. Mas, com a lei, a responsabilidade deve ser dividida entre todos. Nós consumidores temos a nossa responsabilidade também, e temos que fazer a nossa parte. Além desse marco, é fundamental potencializar a coleta seletiva visando a separação dos resíduos e aumento da reciclagem no país. Há necessidade de fazer a disposição final adequada dos rejeitos em aterros sanitários, e ainda incluir catadores de materiais recicláveis e promover ações de Educação Ambiental para reduzir a geração de resíduos e incentivar o consumo sustentável.
O governo apoiou os municípios, inclusive com investimentos, a elaborar planos municipais de resíduos. Quanto o governo federal já investiu e de que forma tem sido o acompanhamento nos estados e municípios?
O governo federal, por intermédio do Ministério do Meio Ambiente, investiu R$ 57 milhões, entre 2011 e 2012, para apoio à elaboração de planos, através de contrato de repasse para a Caixa Econômica Federal. A área técnica do Ministério do Meio Ambiente que atua nessa área também tem acompanhado a elaboração dos planos e ajudado os municípios a sanar dúvidas sobre o processo. Outros ministérios também dispõem de recursos para investimento na área.
Muitos municípios extrapolaram o prazo de elaboração de um plano, que era até agosto de 2012. A que a senhora atribui o atraso?
A lei estabeleceu agosto de 2012 como prazo para elaboração dos planos e com isso ter acesso aos recursos da União. A maioria dos estados e uma quantidade expressiva de municípios estão elaborando os seus planos, um instrumento essencial ao planejamento. No estado da Bahia, 60% dos municípios estão com os seus planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos em elaboração.
Aterro de Canabrava funcionou como lixão a céu aberto e depósito de resíduos sólidos entre 1973 e 1992
A questão ambiental ainda permanece de alguma forma dissociada das gestões estaduais e municipais? A implantação da PNRS seria uma forma de forçá-los a integrar essas questões em seus planos de governo?
Os gestores estaduais e municipais, em sua maioria, já adotam práticas que buscam a preservação do meio ambiente nas atividades de gestão. Então, a PNRS veio para estimular o avanço necessário ao país no enfrentamento dos principais problemas ambientais, sociais e econômicos decorrentes do manejo inadequado dos resíduos sólidos. Isto porque a lei prevê a proteção da saúde pública e da qualidade ambiental, a prevenção e a redução na geração de resíduos. A proposta é colocar em prática hábitos de consumo sustentável e um conjunto de instrumentos para propiciar o aumento da reciclagem e da reutilização dos resíduos sólidos (aquilo que tem valor econômico e pode ser reciclado ou reaproveitado) e a destinação ambientalmente adequada dos rejeitos (aquilo que não pode ser reciclado ou reutilizado). A nova lei prevê ainda a adoção, desenvolvimento e aprimoramento de tecnologias limpas como forma de minimizar impactos ambientais, a redução do volume e da periculosidade de resíduos e também a gestão integrada de resíduos sólidos.
Qual o principal desafio dos prefeitos eleitos no ano passado no cumprimento da Política Nacional de Resíduos Sólidos?
Sem dúvida, acabar com os lixões até 2014. Instalar os novos aterros sanitários para o recebimento apenas de rejeitos é um grande desafio. Mas estamos todos trabalhando e empenhando esforços para alcançar essa meta.
Um dos focos da PNRS é a logística reversa, que responsabiliza quem produz o resíduo, obrigando distribuidores, produtores e importadores a darem uma destinação final adequada, envolvendo escalas de reaproveitamento que incluem os catadores. Como funcionam as cadeias dessa logística? De que forma isso é um avanço na escala macro dos resíduos sólidos?
A logística reversa poderá ser implantada através de acordos setoriais, regulamentos ou termos de compromisso assinados entre o poder público e as cadeias produtivas, que se comprometem, por meio de prazos e metas, a trazer de volta os produtos e embalagens do pós uso, tratá-los e reintroduzi-los no ciclo produtivo. A proposta é que, com o avanço da PNRS e através dos acordos setoriais, termos ou compromissos, haja uma expansão da quantidade de embalagens recolhidas, triadas (sempre que possível, incorporando o trabalho dos catadores) e recicladas. Assim, essas voltariam à cadeia na forma de outros produtos, ou seja, diminuindo-se o impacto da extração de matéria-prima e evitando-se o lançamento de tais embalagens com resíduos altamente tóxicos em lixões. Isso vai permitir que o Brasil economize recursos financeiros e ambientais, tais como matérias-primas, energia e água.
De que forma municípios, estados e o governo federal podem estimular pequenas estratégias para destinação dos resíduos sólidos?
Os gestores públicos podem e devem estimular a participação social, respeitando a competência legal de cada setor da sociedade. O estímulo pode ser dado a partir de campanhas de conscientização, implantação da coleta seletiva no município, com a participação de catadores, e ações de educação ambiental com as escolas e os moradores. Também a Conferência Nacional de Meio Ambiente, que tem etapas municipais, estaduais e livres, tem como tema os Resíduos Sólidos e discutirá impactos da política, geração de emprego e renda, produção e consumo sustentável e educação ambiental. Então, municípios e estados devem incentivar que gestores e moradores participem das discussões das conferências.
A PNRS proíbe as moradias no entorno das áreas de destinação dos rejeitos. Como será conduzida a questão social de moradores que, eventualmente, venham a morar perto dessas áreas?
A PNRS estabelece que a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos deve ser em aterros sanitários. Os aterros sanitários, uma obra de engenharia para operacionalização, faz o controle de acesso de pessoas, entre outras funções. E o processo de licenciamento do aterro sanitário deve atender a algumas condicionantes, dentre elas, o afastamento mínimo das residências exigido pelos órgãos de Meio Ambiente.
Como os catadores se beneficiam da PNRS?
Os catadores são os responsáveis por grande parte da reciclagem hoje existente no Brasil. Com a PNRS eles têm incentivos para trabalhar organizados em cooperativas ou associações, de modo seguro e salubre e com a correspondente remuneração pela atividade. Vale mencionar que a remuneração média de um catador que atua de modo individual ou isolado não chega a um salário mínimo. Enquanto que para catadores organizados em cooperativas e contratados pelos municípios ou pelo setor privado a remuneração pode chegar a R$ 2.500.(correio)