Planejamento em mobilidade muda a cara de Salvador
Maior capital do Nordeste, Salvador passou recentemente por uma verdadeira revolução em seus sistemas de mobilidade urbana. O sinal mais evidente disso foi a inauguração das suas duas linhas de metrô, em 2016. Junto a elas, vieram a integração dos ônibus e outras obras viárias que são apenas o início da aplicação do plano de mobilidade da capital baiana, que visa tornar o transporte da cidade mais racional e inclusivo pelos próximos 30 anos.
Com cerca de 3 milhões de habitantes, e primeira capital do Brasil, Salvador sofre as consequências de um problema histórico também enfrentado por outras grandes cidades brasileiras: o crescimento desordenado. “Salvador é uma cidade de ruas estreitas centenárias, muito engarrafada, onde se vê os automóveis subindo nos passeios públicos”, afirma Juan Pedro Moreno Delgado, professor do Departamento de Engenharia de Transportes e Geodésia da Escola Politécnica da UFBA.
Esse cenário é dificultado pelo caráter acidentado da cidade, com inúmeros morros e vales que separam os bairros e travam o deslocamento. “Poucas cidades no mundo têm uma topografia como a de Salvador”, diz Moreno.
Sem planejamento adequado, a mobilidade acaba sendo estrangulada. Um exemplo é a maneira como se formaram as principais avenidas da capital: a Luiz Viana, mais conhecida como Paralela, a BR-324 e a Avenida Afrânio Peixoto, ou Suburbana. Elas cortam a cidade do norte ao sul, onde fica o centro histórico: quem precisa transitar de maneira transversal, ou seja, de leste a oeste, não encontra vias rápidas, sendo obrigado a passar pelo centro para ir de um lado ao outro com mais rapidez.
O resultado disso tudo foi que, nos últimos anos, Salvador esteve presente nos rankings das cidades mais congestionadas do mundo. Um levantamento publicado em 2016 pela fabricante de sistemas de GPS TomTom, com base em dados de 2015, colocou a capital como a sétima localidade mais engarrafada do planeta, e a segunda do Brasil, perdendo apenas para o Rio de Janeiro.
Mobilidade mais racional
Criada em 2012 por meio de lei federal, a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU) surgiu para trazer uma solução a problemas como os de Salvador. Ela coloca como prioridade o transporte coletivo sobre o individual e os sistemas não-motorizados sobre os motorizados, visando reduzir impactos ambientais e trazer mais racionalidade para a locomoção nas grandes cidades brasileiras.
“Essa lei é muito avançada, ela muda o paradigma de transporte no Brasil”, diz Ilce Marília Dantas Pinto, professora do Departamento de Engenharia de Transportes e Geodésia da Escola Politécnica da UFBA. “Ela dá acesso universal à cidade, para ricos, pobres ou pessoas com deficiência, e com uma visão de sustentabilidade.”
Entre outras coisas, a lei que criou a PNMU obriga as cidades com mais de 20 mil habitantes a adotarem planos de mobilidade, em conformidade com as diretrizes estabelecidas por ela. Salvador concluiu o seu em dezembro: o Plano de Mobilidade Urbana Sustentável (PlanMob) foi consolidado depois de uma fase de audiências públicas, em que diversos setores tiveram a oportunidade de apresentar colaborações.
Seguindo as normas da lei federal, o PlanMob coloca o transporte coletivo acima de tudo. Dentro dessa lógica, está inserida a construção do VLT do Subúrbio, que ligará o bairro de Paripe até Comércio, no centro da cidade. Também foram previstos prolongamentos do BRT (Bus Rapid Transit) e do BRS (Bus Rapid System), trazendo mais fluidez na circulação de ônibus.
O plano visa ainda o aumento da qualidade da locomoção a pé e por bicicletas, com a melhoria de calçadas e a criação e ampliação de ciclovias. Também estão previstas novas vias transversais no centro, assim como a implantação de novos planos inclinados e teleféricos, para facilitar o deslocamento nas áreas mais acidentadas.
Segundo o secretário de Mobilidade de Salvador, Fábio Mota, o objetivo do PlanMob é planejar a cidade até 2049, quando completa 500 anos. “São propostas que atendem o critério de acessibilidade e ao crescimento populacional que teremos nos próximos anos”, afirma.
Revolução sobre trilhos
O metrô de Salvador já está totalmente inserido no contexto da mudança pretendida pelo PlanMob e, em nível nacional, pela PNMU, sendo um sistema de transporte de massa eficiente e sustentável. Inaugurado para testes em 2014 e aberto para operação comercial em 2016, ele já é um dos maiores sistemas metroviários do país, com 29 km de extensão.
Hoje, as duas linhas do metrô de Salvador contam com 19 estações e cinco terminais de integração com ônibus. O projeto final prevê 42 km de extensão, 23 estações e dez terminais de ônibus integrados, contemplando a expansão da Linha 1, de Pirajá até Cajazeiras/Águas Claras, e da Linha 2, da Estação Aeroporto até Lauro de Freitas.
Atualmente o metrô transporta 280 mil pessoas por dia, e a previsão é que este número chegue a 500 mil ainda em 2018. Segundo Luiz Valença, presidente do CCR Metrô Bahia, empresa que opera o sistema, pesquisas indicam um índice de satisfação bastante alto por parte dos usuários, superando 90%.
Junto ao metrô, Salvador ganhou nos últimos anos diversas melhorias em importantes vias e estruturas de transporte. A Avenida Paralela, que liga o centro até o aeroporto, terá 12 km de ciclovias e pista de corrida, além de receber passarelas e mais de 6 mil novas árvores. Recentemente, foi inaugurada a passarela de acesso à Estação Rodoviária da Linha 2 do Metrô. Com 8,8 m de largura total, 800 m de extensão e 1.200 toneladas, ela é a maior do sistema metroviário da capital, com uma capacidade para 42 mil pedestres por hora.
A próxima novidade no metrô de Salvador será o início da operação comercial da Estação Aeroporto. Após a realização de testes, a estação deve ser inaugurada até o fim de março.
Juan Moreno, da UFBA, lembra que o metrô era uma demanda antiga para resolver os problemas de mobilidade. “A força de transformação do metrô é tremenda, ele tem um impacto social e econômico muito forte”, diz. “Ele possibilita que as pessoas ganhem tempo de viagem e comecem a ter mais confiança no transporte público, se cria uma nova cultura.”(G1)