10% dos deputados atuais não seriam eleitos no ‘distritão’; PMDB seria beneficiado
A reforma política se tornou prioridade para os caciques dos principais partidos políticos. E um dos pontos é a adoção do sistema do “distritão” nas eleições de 2018. Mas se este sistema já estivesse em vigor nas eleições de 2014, quase 10% dos atuais integrantes da Câmara dos Deputados seriam diferentes: 45 dos 513 deputados atuais não teriam sido eleitos.
O PMDB e o PSD seriam os principais partidos beneficiados, com 6 deputados a mais cada. Para o PT, o saldo seria de 3 vagas a mais. PP e PSDB continuariam com o mesmo número de cadeiras, e o PR perderia 2 deputados.
O sistema do “distritão” iguala a disputa dos deputados à dos senadores: os mais votados no Estado são eleitos, independente do partido. A vantagem é acabar com o “efeito Tiririca”, em que um nome bem votado acaba elegendo outros, de pouca relevância.
Na eleição “proporcional”, como acontece hoje, os votos de cada coligação de partidos são somados e divididos por um número, chamado quociente eleitoral. O resultado determina o número de cadeiras que a coligação terá. Assim, um candidato com poucos votos dentro de uma coligação forte pode acabar eleito. Mesmo em detrimento de outro, mais votado, que faça parte de uma coligação menor.
O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira (eleito pelo PTB-RS), está na lista dos que ficariam de fora se o “distritão” estivesse em vigor em 2014. Outro que não teria os votos necessários é Beto Mansur (PRB-SP), um dos principais articuladores de Michel Temer no Congresso.
Mansur é contra a adoção do “distritão”. Para ele, a mudança de sistema agora só interessa a alguns partidos grandes, como o PMDB e o PSDB.
“O ‘distritão’ transforma a eleição de deputado em uma disputa majoritária. E numa disputa dessas, importa muito estar junto de um candidato a governador forte, que possa pedir votos para você. PMDB e PSDB têm essa perspectiva, de lançar candidatos competitivos aos governos estaduais. Por isso defendem essa mudança”, diz Mansur
Por outro lado, teria conquistado uma vaga de titular a atual secretária de Políticas para Mulheres de Temer, Fátima Pelaes. Ela concorreu pelo PMDB no Amapá e teve 17,5 mil votos, mas acabou como suplente.
O jornalista esportivo Jorge Kajuru também teria se tornado deputado com os 106,2 mil votos que obteve como candidato pelo PRP de Goiás. Ele não foi eleito, nem para suplente.
Também teriam conquistado uma vaga de titular o ex-ministro da Agricultura Reinhold Stephanes (PSD-PR) e o advogado Wadih Damous (PT-RJ), um dos principais defensores do ex-presidente Lula. Ambos foram eleitos suplentes, e são deputados hoje porque os titulares se licenciaram do cargo. Ao todo, há hoje 14 deputados nessa situação.
O presidente da comissão especial da reforma política, deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), acredita que é possível aprovar a reforma política no plenário da Câmara nos próximos 15 dias. E que o “distritão” deve passar, mesmo que como uma regra de transição para as eleições de 2022.
“Os partidos estão conversando. Vão perceber que o ‘distritão’ é o melhor para eles. Reduz o número de candidatos e, por consequência, o dinheiro gasto. É uma alternativa a ter que aumentar o financiamento público das campanhas”, diz Lúcio Vieira Lima. “Ademais, não se pode fazer reforma política pensando nisso, em quem entraria e quem ficaria de fora”, diz Lúcio.
O cientista político Cláudio Couto lembra que os partidos e candidatos teriam adotado outras estratégias em 2014, caso o sistema eleitoral fosse outro.
“A projeção [feita pela reportagem] com base nas eleições de 2014 é até útil para entender tendências. Mas, se a regra do jogo fosse outra, os atores teriam agido de forma diferente. E o resultado possivelmente teria sido diferente do projetado”, diz ele, que é professor da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo.
Couto discorda ainda da hipótese de que o “distritão” diminuirá o custo das campanhas. “A competição ficará mais acirrada entre os candidatos. Os gastos terão de crescer para enfrentar a disputa”, diz ele.
O “distritão” é usado em poucos países do mundo. Hoje, só adotam este método o Afeganistão, os Emirados Árabes Unidos, o Kuwait e Vanuatu, além das Ilhas Pitcairn (um território britânico no Pacífico).
O principal ponto negativo do “distritão” é o desperdício de votos, pois votos dados a candidatos não eleitos deixam de influenciar o resultado. Além disso, o sistema beneficia os atuais ocupantes do cargo, dificultando a renovação no Legislativo. (BBC)