Economia

A conta não fecha

Depois das resistências no Congresso e das flexibilizações na reforma da Previdência alinhavadas pelo relator Arthur Maia (PPS-BA), instalou-se uma disputa entre analistas de mercado e a equipe econômica do governo Temer, em torno dos impactos econômicos das alterações introduzidas no projeto de reforma.

Nos cálculos oficiais, as regras mais frouxas do relatório de Maia resultariam, em dez anos, na perda de R$ 200 bilhões em relação à economia prevista na proposta original. Nas contas de bancos e consultores, a redução, no mesmo período, poderia chegar a R$ 350 bilhões.

A discrepância das estimativas remete para a linha demarcatória imaginada pelos técnicos do mercado a partir da qual a confiança nos efeitos da contenção de gastos com a Previdência, como parte da sustentação de uma recuperação virtuosa da economia, ganharia substância.

Todos sabiam que seria impossível entregar 100% do previsto na reforma original, que, por sinal, já conteria gorduras — idade mínima sem diferença de gênero, regra de transição muito desnivelada, por exemplo — para serem lipoaspiradas nas negociações com o Congresso. Mas também havia um consenso de que estaria de bom tamanho aprovar uma reforma com pelo menos 70% da economia original estimada.

Na contabilidade do governo, as concessões até aqui negociadas expressariam corte de 25% nas economias inicialmente previstas.

Para analistas do setor privado, as alterações já incorporadas ao texto original implicariam perdas superiores a 40% — algumas projeções chegam a 60% de redução. Um limite, portanto, abaixo do que se convencionou considerar como suficiente para que a reforma produzisse seus efeitos positivos.

Isso sem considerar o que ainda pode ser diluído até a votação final do texto — um amplo espaço a ser percorrido, dadas as resistências dos parlamentares mesmo depois das mudanças já promovidas, bem expressas em pesquisas de voto em plenário, até aqui bastante desfavoráveis ao governo.

Não é difícil entender o que está por trás do cálculo dos analistas. Não visão deles, um afrouxamento excessivo nas regras de habilitação aos benefícios previdenciários poderia resultar em dificuldades ainda maiores para fazer cumprir, ao longo do tempo, o teto de gastos públicos recém introduzido na Constituição.

E que, se essas dificuldades se confirmarem, a recuperação da economia, caso não seja abortada, revertendo, entre outros, a trajetória descendente das taxas básicas de juros, tenderia a se apresentar mais fraca e mais lenta.

Não custa deixar claro, a essa altura, que, embora vendida como uma espécie de “tudo ou nada” para o êxito do cumprimento do teto de gastos, a reforma da Previdência, ainda que fosse aprovada nos já abandonados rígidos termos originais, estaria longe de cumprir esse papel.

De acordo com projeções do próprio governo, se mantido estritamente, o teto de gastos proporcionaria, em dez anos, uma redução dos gastos primários federais de 19,8% do PIB para 15% do PIB.

Nesse corte de quase cinco pontos percentuais, a contenção das despesas com a Previdência, na versão original, responderia por menos de dois pontos da redução prevista.

Na versão desidratada atual, sua contribuição para o encolhimento dos gastos, em relação ao PIB, se restringiria a cerca de um ponto — ou 20% do total.

O pragmatismo que predomina nas análises dos economistas ditos de mercado já parece ter incorporado a inevitável acomodação da reforma da Previdência aos termos possíveis para sua aprovação.

Esse sentimento se traduz pela agora já aberta conclusão de que a reforma em curso terá prazo relativamente curto de validade, exigindo novo ajuste em algo como cinco anos.

Mais do que isso, subsistem poucas dúvidas de que a conta do teto de gastos não fecha sem novos cortes de despesas no futuro ou mesmo uma revisão nas regras que determinam seu restrito montante.

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