GeralMeio AmbienteSem categoria

Muito barulho, poluição, sujeira e dramas

Entre as queixas registradas pela Ouvidoria Central ocupam o primeiro lugar as que têm como causa os ruídos que incomodam os contribuintes, já que o Plano Diretor de 2014 deixara de fora esse instrumento de defesa da população E embora pesquisas na área indiquem (Página 22, outubro de 2014) que o tráfego de veículos é “o grande vilão das cidades”: Fortaleza é a única capital que tem uma “carta acústica”.
Na União Europeia essas “cartas” são obrigatórias nas cidades com mais de 200 mil habitantes – pediatras norte-americanos e canadenses recomendam que as crianças até 2 anos de idade não sejam expostas a ambientes com esse problema, bem como a tecnologias de aparelhos móveis, celulares, tablets e jogos eletrônicos; mesmo depois dessa idade a exposição não deve ultrapassar duas horas diárias. O excesso pode acelerar o crescimento cerebral, obesidade, privação do sono, agressividade, dependências.
Pesquisa da USP (mobilize, 30/5) indica que 22% dos paulistanos têm problemas auditivos causados por ruídos no trânsito. Outros trabalhos acrescentam que o trânsito intenso pode aumentar a temperatura em até 4 graus Celsius. Veículos a diesel e caminhonetes são os mais problemáticos. E para enfrentar tudo isso não se pode dispensar a inspeção veicular, a melhoria da qualidade dos combustíveis e o controle de emissões em certas áreas. Há ainda trabalhos que apontam a fuligem como a causa de morte de 8% dos idosos, assim como problemas para os fetos durante a gravidez.
São Paulo é considerada pelos especialistas “uma das cidades mais barulhentas no mundo” (Página 22). E já tem – como comentado neste mesmo espaço – moradores com aplicativos que lhes dizem com quem compartilhar lugares silenciosos. Como há outros que se reúnem em cemitérios. Não é para menos, quando se leva mais de hora para ir de casa para o trabalho e outro tanto para voltar. Com alta intensidade de ruídos, acima de 100 decibéis, quando o máximo suportável é de 120. E vale a pena lembrar que já em 1867, segundo a pesquisadora Márcia Correa, da Universidade Aberta da Unicamp, havia no Brasil multas para carros de boi que rangessem por falta de graxa; em 1922 um ato municipal proibiu o estalo de chicotes em cavalos que puxassem carruagens. Hoje há estudos que avaliam a perda auditiva em cinco categorias profissionais – metalúrgicos, trabalhadores no setor calçadista, transportadores de cargas, operários em cerâmicas e na indústria cervejeira. Houve piora de situação relacionada com a idade e o tempo no trabalho.
E não se pode ficar restrito à poluição sonora. A própria ONU alerta (mst, 28/5) que a degradação ambiental responde por mais de 12 milhões de mortes a cada ano, ou 23% de todas as mortes prematuras. Essa taxa está em 11% em países europeus da OCDE e em 28% no Sudeste Asiático. As doenças vão de diarreias a asma, infecções respiratórias, obstrução pulmonar crônica, doenças vasculares, cânceres. O principal fator é a poluição, geradora da “emergência global de saúde”.
No Brasil, a média de material particulado no ar que se respira é de 150 microgramas por metro cúbico, quando a Organização Mundial de Saúde recomenda que não se deve ultrapassar 50 microgramas. No Rio de Janeiro e outras cidades fluminenses são mais de 1,5 vez mais altas as mortes por poluição que as decorrentes de acidentes de trânsito, três vezes mais que as do câncer de mama e a aids, quase sete vezes mais que o câncer da próstata. E o Pnuma assegura que até 2030, se se conseguir reduzir as emissões de “gases do efeito estufa”, pode-se salvar a vida de 2,4 milhões de pessoas.
Com todas essas informações, órgãos públicos continuam a facilitar a expansão urbana e seus limites, a concentração de moradores, a emissão de poluentes nas casas, na indústria, no comércio, no trânsito, em toda parte. No editorial Zoneamento deturpado (25/2, A3), este jornal criticou decisões no âmbito da Lei de Zoneamento, como a que aumentou de 40 para 50 decibéis o nível tolerável de barulho das 22 às 7 horas. A oposição anunciou que iria à Justiça. Terá muitos argumentos.
Pode-se passar a outro capítulo, o da “poluição luminosa”. O jornalista Júlio Ottoboni assegura (Eco 21, outubro de 2014) que esse tipo de poluição tem crescido em “nível alarmante” no eixo Rio-São Paulo. É o mais alto no Hemisfério Sul e afeta também animais e plantas. Nos Estados Unidos, 22% da geração de energia elétrica se destina à iluminação noturna; no Brasil, 4,5%. Entre os problemas que causa estão os distúrbios do sono e do sistema nervoso, depressão, até câncer de mama. E isso quando se sabe que 40% da energia é desperdiçada (no Brasil, até 60%).
Sobram ainda os acidentes de trânsito, fruto uma frota de veículos no País que a Fenabrave espera que cresça mais de 3,5 milhões de unidades por ano, quando já está acima de 80 milhões, e as cidades não comportam mais esse crescimento e suas consequências dramáticas – na poluição do ar, no tempo perdido em congestionamentos, nos problemas para pedestres. Que mais se vai esperar de algo como um veículo que permanece mais de 80% do tempo ocioso e mais problemas criará se esse tempo for maior?
Enfim, evidências dos dramas não faltam. Mas quem os enfrentará, quando uma grande montadora afirma que a estação de combustível do futuro pode ser o próprio carro (Nissannews, 3/3)? E quando o sonho de parte das pessoas é conseguir comprar um carro, e não ter um sistema de transporte eficaz e confortável? (O Estado de S. Paulo/ #Envolverde)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *