Eleição será teste após reforma política
Em 2015, foi sancionada a mini-reforma política aprovada no Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal proibiu doações de empresas para campanhas eleitorais. As mudanças no Código Eleitoral brasileiro serão testadas nas eleições municipais em outubro.
Dentre as alterações, algumas já ocorreram como o prazo de filiação partidária para quem pretende disputar cargos eletivos e que encerrou no dia 2 desse mês. Dentre as modificações, a que mais deverá impactar as campanhas eleitorais é a proibição do financiamento por pessoas jurídicas. Agora, apenas pessoas físicas podem doar e as campanhas terão como fonte de recursos o Fundo Partidário.
Para o mestre em direito público e analista judiciário do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA), professor Jaime Barreiros, as eleições municipais devem ser observadas por se tratar de um grande teste das novas regras eleitorais. “[Fim do financiamento privado] foi uma boa ideia para tornar a competição mais igualitária. Nos modelos adotados nos últimos anos, os custos têm sido muito elevados e de fato o dinheiro tem mandado nas campanhas eleitorais.
Não é nem em função de uma virtude dos parlamentares, foi mais em função do Supremo Tribunal Federal ter determinado sua inconstitucionalidade. A eleição desse ano vai ser o grande laboratório para a gente saber se realmente vai funcionar. De fato, vai diminuir bastante o valor possível de se gastar numa campanha eleitoral. A gente não sabe também até que ponto isso não vai incentivar o caixa dois. O grande desafio é esse, a eleição é que vai dar a resposta”, analisou o advogado em entrevista à Tribuna.
Dentre as alterações, está o limite de gastos por campanha. Para prefeito, no 1º turno, o máximo que se poderá gastar é até 70% do maior gasto declarado no município na campanha para prefeito em 2012, caso tenha havido apenas um turno. Caso tenham ocorrido dois turnos, até 50% do valor total gasto. Para vereador, o teto é até 70% do maior gasto declarado no pleito em 2012. Nos municípios de até 10 mil eleitores, o limite de gastos será de R$ 100 mil para prefeito e de R$ 10 mil para vereador. “O limite de gasto vai equilibrar a disputa. O problema que foi estabelecido não chega a ser um teto tão reduzido assim. O caixa dois pode ser que aconteça, é difícil combater o caixa dois”, ressalta Barreiros.
Na reforma política, também foi modificado o calendário para a realização de convenções partidárias. Antes, ocorria entre 10 e 30 de junho, agora será de 20 de julho a 5 de agosto. “Isso prejudica a democracia, porque já vamos ter uma redução da campanha que só vai começar dia 16 de agosto. O tempo de debate público vai ser reduzido. Isso vai beneficiar os candidatos que já são mais conhecidos e a própria Justiça Eleitoral vai ter muitas dificuldades. Várias etapas do processo eleitoral que eram realizadas em etapas de tempo maior vão ser concentradas em uma mesma época.
O trabalho da Justiça Eleitoral vai aumentar muito. O próprio julgamento dos registros de candidaturas tende a não ser realizado no prazo legal. É muito possível que a gente tenha, no dia da eleição, candidato concorrendo sem ainda saber se podia concorrer ou não”, explicou o analista judiciário, a se referir também a redução do tempo de campanha eleitoral de 90 para 45 dias. Segundo disse, a diminuição de campanha e a permissão para divulgação da condição de pré-candidato legitimou a antes vedada propaganda antecipada. “Quem é que se beneficia com isso? O candidato que tem mais dinheiro e é mais conhecido. Nesse momento, a Justiça vai ter dificuldade de fazer balanços dos custos de campanha. Se o individuo quiser investir mais agora, ele vai investir”, frisou.
Novas regras exigirão interação com a sociedade
Na prática, as mudanças nas regras eleitorais exigirão adaptação dos candidatos e políticos acostumados com os tradicionais ritos das eleições. A proibição da doação privada significará menos dinheiro, em tese, nas campanhas, mas segundo o presidente do PCdoB na Bahia, o deputado federal Daniel Almeida, que foi um dos articuladores da elaboração da reforma política em Brasília, a agremiação comunista não terá grandes problemas com as modificações.
“Para nós do PCdoB, não tem grande impacto. Sempre fizemos campanhas modestas e sempre se fez muita arrecadação a partir de militantes, em jantares e mobilizações entre amigos para apoiar a campanha. Isso terá impacto, mas não será tão expressivo como será para alguns que sempre fizeram e agora não vão ter. Vai valer muito a pena buscar um nivelamento maior das disputas diminuindo o papel do dinheiro”, assinalou Almeida.
O mesmo pensamento tem o presidente do PT na Bahia, Everaldo Anunciação. “Será a primeira eleição sem financiamento empresarial, além de ser essa uma defesa do PT, nos ajuda porque cria uma relação mais próxima com o povo e com os setores organizados. Vamos ter um período de transição, pois todas as campanhas anteriores tinham sido feitas com esse outro método. Mas penso que isso vai ter ganho para o PT e vai exigir dos órgãos de fiscalização maior acompanhamento desses partidos que historicamente só tiveram avanços através de imposição de poder ou da prática de compra de votos”, disse, citando partidos de oposição ao PT. Segundo o petista, o fim do financiamento privado e o limite de gastos por campanha terá bons resultados. “Vai exigir muita criatividade, isso é bom. Vai exigir ainda muito esforço e comprometimento com as reais intenções da população. Isso vai permitir esse ambiente de mais proximidade com a sociedade, que tem cada vez mais elevados conhecimentos e nível de crítica”.
Ambos os dirigentes defendem que a redução da campanha de 90 para 45 dias representa um desafio para os candidatos. “O que se tem que fazer é um trabalho com mais esforço na pré-campanha. O candidato que vai se apresentar no dia da eleição, não pode ficar apenas aguardando ser apresentado como um produto a ser consumido pelo eleitor no momento da campanha no rádio e na televisão. Acho será a oportunidade na pré-campanha para ele se apresentar por inteiro com palestras, debates, encontros, reuniões de preparação de programa de governo, tudo isso está liberado já hoje”, diz Daniel Almeida, ao falar sobre o assunto.(TB)