Historía é dramática para herdeiros de nomes fortes
Nunca é fácil, na história, a vida política dos herdeiros de líderes carismáticos que foram ungidos à condição de verdadeiras lendas em seus países e no mundo. Destinos trágicos chegaram até mesmo a se repetir, como a morte, por assassinato, dos irmãos John F. Kennedy e seu irmão Robert Kennedy. O primeiro foi morto em 1963, quando era presidente, e sua imagem projetou a do irmão, Robert. Este, no entanto, morreu em 1967 quando parecia avançar por um caminho sem volta para a Casa Branca. A América Latina conhece bem a dramaticidade que uma sucessão feita à base da emoção, acima do racionalismo ou por determinação do testamento político do líder desaparecido, por causar na vida de pelo menos duas de suas maiores nações.
Na Argentina do caudilho Juan Domingo Perón, sacudida na década de 1950 pela morte de Eva Perón, mergulhou numa das mais sangrentas ditaduras militares do continente depois que, nos anos 1970, Isabelita Perón, eleita como vice-presidente na chapa do marido Juan Domingo. Sob descontrole da economia, ela foi deposta pelos militares, que interromperam a democracia.
Mais recente, o exemplo marcante é o da Venezuela. Com câncer terminal, o então presidente Hugo Chávez apontou para Nicolás Maduro, um ex-motorista de ônibus, como seu herdeiro direto. Numa eleição vencida por diferença de pouco mais de 1% dos votos, em 2012, Maduro assumiu o poder, mas não tem tido vida fácil. Com forte oposição nas ruas, ele vem precisando ter forte controle sobre o aparato repressivo para conseguir uma certa estabilidade política.
Os exemplos históricos vêm à tona diante da brusca mudança de rumo experimentada pela eleição presidencial brasileira. A morte do presidenciável Eduardo Campos encheu o ambiente de emotividade, que tende a crescer ainda mais em razão da escolha, a esta altura praticamente definida, da ex-ministra Marina Silva para seu lugar como candidata a presidente.
Fortemente religiosa, em declaração pública quando embarcava para Recife, no sábado 16, para participar das cerimônias fúnebres para Campos, Marina disse que não morreu com ele por “providência divina”. Para ela, foi a mão de Deus que a orientou para não subir naquele avião. O motivo conhecido foi o de que Marina não queria encontrar com o governador Geraldo Alckmin, no evento de campanha que esperava por Campos.
A declaração de Marina, em tudo de fundo religiosa, demonstra que, se ela vier a ser a candidata a presidente pelo PSB, como já admite o presidente da legenda, Roberto Amaral, fará questão de empregar, o mais fortemente possível, um tom de determinismo histórico sobre a tragédia. O que houve com Campos poderá, por esse aspecto, ampliar o carisma de Marina. Se isso é capaz de empolgar muitos eleitores, também pode ser motivo de rejeição para quem deplora o voto com matriz religiosa ou espiritual.
Pelo que se viu especialmente na América Latina, a sucessão por herdeiros diretos de grandes lideranças desaparecidas de maneira abrupta carrega o signo do drama. Foi assim com Perón, Kirchner e Chávez. Num canto do mundo onde a religiosidade e a paixão são marcas registradas da maioria do povo, e a estabilidade política e econômica são traços recentes, não havia muito como ser diferente. (247)