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Defesa pede anulação do processo contra a médica Kátia Vargas

Fundamentado em 56 páginas e assinado pelos advogados Sérgio Habib, Rosa Sales e Fabiano Pimentel, o pedido de anulação alega que o Ministério Público mudou a acusação ao longo do processo sem dar à defesa o tempo garantido pela lei.
E ressalta: “Narra, ainda, a denúncia que a Acusada saíra de uma transversal da Avenida Oceânica, denominada Rua Morro do Escravo Miguel, tentando de imediato tomar a pista da esquerda, e teria, supostamente, “fechado” as vítimas, que trafegavam a bordo de uma motocicleta na Avenida Oceânica, sentido Barra/Rio Vermelho, o que fez com que o piloto Emanuel Gomes Dias protestasse contra a atitude imprudente da Paciente, batendo na lateral do carro desta, e seguido em frente, próximo ao meio fio da margem direita da via, deixando o carro para trás, ação que supostamente teria feito com que a Paciente imprimisse velocidade ao veículo e com intenso “animus necandi” [Termo em latim que significa dolo, vontade. É a intenção de matar, ou seja, de tirar a vida de outra pessoa], teria se aproximado da moto, arremessando seu carro contra o fundo desta, projetando as vítimas contra um poste, matando-as, por consequência, ação que, segundo ainda a denúncia, impossibilitara qualquer manobra defensiva do piloto Emanuel”.
Foi essa acusação que levou à prisão da médica por 2 meses, mas de acordo com Sérgio Habib, Rosa Sales e Fabiano Pimentel, o Ministério Público “em momento algum da denúncia” descreveu o motivo do crime. “Não há sequer menção ao suposto ‘motivo torpe'”, levantado pelo MP durante as alegações finais, no dia da audiência da médica.
O que está acontecendo, diz a defesa, “é verdadeira mutatio libelli [surgimento de circunstância elementar nova, em que o juiz precisa mandar ouvir a defesa] escondida sob a pele daemendatio libelli [usada quando há erro na denúncia ou queixa na classificação do delito, caso em que o juiz faz a correção independente de qualquer diligência] já, que em nenhum momento, a denúncia tratou sobre a motivação do delito”.
Neste caso, narra a defesa, deve-se aplicar o artigo 384 do Código de Processo Penal, que estabelece: “Se o juiz reconhecer a possibilidade de nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de circunstância elementar, não contida, explícita ou implicitamente, na denúncia ou queixa, baixará o processo, a fim de que a defesa, no prazo de 8 (oito) dias, fale e, se quiser, produza prova, podendo ser ouvidas até três testemunhas”.
A inobservância do artigo 384 “é causa de nulidade absoluta em face da ofensa ao princípio da correlação”, destacam os advogados. É a regra segundo a qual o fato imputado ao réu, na peça inicial acusatória, deve guardar perfeita correspondência com o fato reconhecido pelo juiz, na pronúncia, “sob pena de grave violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, consequentemente, ao devido processo legal”.
Como a defesa ficou impedida de produzir novas provas e de manifestar-se nesse sentido, o fato “aniquila o processo pela nulidade absoluta”, sustentam os três advogados, que anexam a posição adotada pelo juiz Moacyr Pitta Lima, para demonstrar a falta de correlação entre o pedido do Ministério Público e o entendimento do magistrado:
“Quanto ao mérito da qualificadora manejada pela acusação, há nos autos indícios de que de fato a motivação da conduta imputada à acusada foi um incidente de trânsito, nos moldes da descrição contida na denúncia, consubstanciados, sobretudo, no depoimento da testemunha Álvaro Lima Freitas.
Não compete a esse juízo, em sede de pronúncia, analisar com profundidade e de forma valorativa a prova produzida, de modo a estabelecer em juízo definitivo se foi essa a motivação e em caso afirmativo qual a intensidade desse desentendimento.
O fato é que se houve sério e grave desentendimento estaria descaracterizada a torpeza, porém se o referido incidente foi de pequena monta, como descrito na denúncia, poderia configurar a futilidade da motivação e não a torpeza.
Desta forma, deve ser reconhecida em juízo de admissibilidade a futilidade da motivação de modo a permitir que o conselho de sentença delibere acerca da existência do referido incidente de trânsito bem como acerca de sua intensidade e eventual futilidade”.
Segundo os advogados, durante toda a instrução criminal, a acusada exerceu a sua defesa tomando por base o que se continha na denúncia. “Estranhamente, o d. magistrado pronunciou a Recorrente incluindo a qualificadora de motivo fútil, fato este nunca mencionado nos autos, nem mesmo pelo Ministério Público”. E concluem: “Se houve entrevero entre as partes, não há motivo fútil!”. Esse entendimento, asseguram, é claro nos tribunais.
Júri popular
Habib, Sales e Pimentel procuram descaracterizar, também, o acolhimento da denúncia que determina o julgamento do caso por júri popular. “Para a melhor doutrina, o crime de homicídio deve ser acompanhado do elemento subjetivo do tipo, que é, em outras palavras, a vontade consciente e dirigida para o fim de ceifar a vida humana. O dolo, é, na verdade, a vontade manifestada pela pessoa humana de realizar o tipo penal; é a busca da realização da conduta não permitida pela lei” e no caso, sustentam, inexistia motivo para que a médica desejasse, direta ou indiretamente, o resultado morte. 
“Nunca, jamais, restou qualquer comprovação, informações, indícios sequer, que a denunciada agira na forma como narrado na denúncia.”
Testemunhas
Os relatos de duas testemunhas arroladas pelo Ministério Público são lembrados pelos advogados de defesa. O taxista Hamilton de Jesus ao ser ouvido afirma que: “Não sabe informar em que circunstâncias ocorreu a colisão, só viu o Kia Sorento batido entre a grade e o muro”.  A testemunha Álvaro Lima Freitas afirma que estava fazendo uma caminhada, teria visto apenas uma discussão entre o condutor da motocicleta e a condutora do Kia e “não pode afirmar se o Kia Sorento colidiu com a moto, não sabe informar em que circunstâncias ocorreu o acidente”.
“Sequer existe prova nos autos de que houve colisão entre o carro e a moto, portanto, não há nenhuma comprovação de que a acusada teria causado o fatídico acidente”, dizem Sérgio Habib, Rosa Sales e Fabiano Pimentel, no pedido de anulação do processo.

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