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Festa no interior

Se não aconteceu nada – entre a hora, na tarde de ontem, em que este comentário foi escrito e o momento em que ele é lido, nesta sexta-feira – o Brasil amanheceu em   7 de junho de 2013 com 5.565 municípios. Não parece um número excessivo, considerando a extensão territorial brasileira e o número de estados que temos. Em tese, uma desconcentração até permitiria melhor gestão.
 
Não é o que ocorre no Brasil, entretanto, em razão de nossos imensos vícios políticos, além, naturalmente, da tendência histórica nacional, subtraída apenas em poucos momentos de nossa vida, de excessiva concentração de poder (e de dinheiro público, obviamente) em Brasília, em detrimento das outras unidades da federação.
 
O resultado disso – e os números são de entidades ligadas aos próprios municípios – é que mais de 80% das prefeituras do País não têm condições de existência por seus próprios meios, dependendo do poder central para cumprir com mínima dignidade suas obrigações. Para fazer isso com objetivo, para valer, é preciso ter condições de atender bem seus cidadãos. 
 
Veja-se os prefeitos das capitais, mesmo o da rica São Paulo, constantemente mendigando  migalhas de verbas federais para tocar os projetos mais comezinhos. A vida de chapéu na mão, por sinal,  também é comum aos  governadores.
 
Essa situação, pode-se argumentar, é um problema ligado aos defeitos do nosso chamado pacto federativo, ou seja, as relações entre o três entes da federação brasileira: a União, os Estados e os municípios. E poderia ser corrigido com  melhor a distribuição dos “direitos” ( arrecadação) e dos “deveres” (prestação de serviços à população) de cada um. A alegação é, pois, somente  meia verdade – ou duas meias verdades.
 
De fato, Brasília fica com muito, e mesmo assim não dá conta de suas obrigações. Está sempre com déficit nas suas contas, e prefeitos e governadores ficam com a parte menor. Fazer uma redistribuição assim não resolve, porque, como se diz popularmente, será desvestir um santo para vestir outro. Aliás, quando se começa a falar muito, no mundo político e burocrático,  em “rever o pacto federativo”, é bom o brasileiro apegar-se a todos os santos possíveis: ele pode virar o pato que vai pagar o pacto com mais impostos nas costas. Em resumo: o Estado brasileiro é caro demais.
 
Essa situação só tende a se agravar com a mania do brasileiro em criar novas unidades federativas sem qualquer amparo na realidade social e econômica do País. Recentemente, graças um  plebiscito, impediu-se a divisão do Pará em mais dois estados, proposta que já havia sido aprovada no Congresso. 
 
Imagine-se o que aconteceria: onde hoje há um governador, um Palácio, alguns deputados estaduais e federais, três senadores e alguns milhares de funcionários públicos,  tudo seria multiplicado por três. E a ser sustentado com o mesmo dinheiro que hoje mal sustenta o Pará. Com que vantagens? Quase nenhuma. 
 
Este mal foi afastado, mas o risco permanece: ainda tramitam no Congresso Nacional oito propostas de criação de novos estados. Se a sociedade dormir, o bicho pega.
 
Nesta semana a Câmara botou outro bicho do mesmo teor em circulação. Aprovou  projeto de lei – em cima de uma proposta que o Senado já havia aprovado – facilitando o processo de criação dos novos municípios no País. O texto ainda voltará para os senadores darem a palavra final, pois foi modificado em parte pelos deputados. Mas ninguém duvide de que ele será aprovado. 
 
Para os parlamentares isso significa prestígio, formação de novos currais eleitorais, etc. E começa a festa: mais prefeitos, Câmaras, prédios, funcionários. A nova lei impõe algumas limitações para que um município novo tenha vida, mas  nada muito rigoroso. E transfere a decisão para as Assembleias Legislativas – e estas são sempre as mais  permissivas.
 
Antes da Constituição de 1988 já era possível criar novas prefeituras – e sempre se criou. Há casos em que há mesmo necessidade e não se pode impedir isso. Entretanto, não havia abusos, pois as autorizações tinham de vir do Congresso. 
 
No afã, legítimo por sinal, de diminuir a concentração de poderes em Brasília, os constituintes,  entre outras providências, transferiram para os deputados estaduais a função de autorizar as novas prefeituras. Foi um ” liberou geral”. Mais de mil novos municípios floresceram em terras tupiniquins em poucos anos. No período de 1988 a 1966, passamos de cerca de 4 mil prefeituras para mais de 5 mil .
 
Foi então que se resolveu fechar as portas para esta irresponsável festa do interior, retirando-se das Assembleias, em 1996, o poder de autorizar novas prefeituras. Agora, volta o festival. Preparem-se para um Brasil burocrático e político mais caro e não necessariamente mais eficiente.

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