As guerras cambiais na economia mundial
O que é pior para a economia global: a contínua estagnação da economia mundial ou o influxo de capitais e a valorização cambial nos países emergentes?
Barry Eichengreen é professor de economia internacional na Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos. Quando Eichengreen fala, vale a pena prestar atenção. No último dia 28 ele publicou importante artigo noFinancial Times ( The world wisely edges away from talk of currency war), sobre guerras cambiais.
Temos falado em demasia que o mundo está sofrendo os efeitos de guerras cambiais entre os países que emitem as principais moedas. Argumenta-se que, ao expandir exageradamente a oferta monetária, esses países estariam afetando as taxas de câmbio de terceiros países, valorizando-as.
Em consequência, a competitividade desses países no mercado internacional estaria se deteriorando. Além disso, a valorização cambial fragilizaria as indústrias dos países afetados pelo aumento da concorrência das importações em seus mercados.
Eichengreen argumenta que o Japão e os Estados Unidos, os “agressores” na guerra cambial, estão promovendo o crescimento da economia mundial – e que esse fato está sendo aceito pelos principais bancos centrais.
É isso que afirma o comunicado do Grupo dos 20, emitido após a reunião do Fundo Monetário e do Banco Mundial, no qual se aponta que “a política monetária deve ser dirigida para atingir-se a estabilidade de preços interna e o contínuo apoio à recuperação econômica, de acordo com os respectivos mandatos dos bancos centrais”.
A levar-se em consideração essa afirmativa, o Banco do Japão está correto em promover a compra agressiva de ativos no mercado para promover uma meta de inflação de 2%, retirando o país de um longo período de deflação e de estagnação econômica.
Pelo mesmo raciocínio, estaria também correto o banco central dos Estados Unidos, o Federal Reserve, cujo mandato duplo determina a estabilidade de preços e o crescimento econômico.
O reconhecimento, pelos demais bancos centrais, de que os mandatos do Banco do Japão (BoJ) e do Federal Reserve (Fed) contemplam também o crescimento econômico, não implica evidentemente que se sintam confortáveis com a excessiva liquidez internacional – promovida anteriormente pelo Federal Reserve e pelo Banco Central Europeu (BCE) e agora também pelo Banco do Japão.
Do ponto de vista do Japão, dos Estados Unidos e da União Europeia, a questão coloca-se sob um outro prisma. O que é pior para a economia mundial e os países emergentes em particular: a contínua estagnação da economia mundial ou o influxo de capitais e a valorização cambial nos países emergentes?
É claro que diversos fatores permitem uma melhor avaliação, por parte dos bancos centrais desses países, das intenções do BoJ, do Fed e do BCE. A compra de ativos pelo BoJ, segundo afirmou o seu governor, tem por objetivos retirar aquele país da deflação e induzir os bancos japoneses a investir em ativos de maior risco, em lugar de promover a desvalorização do ien.
Na mesma linha de argumentação, o governor do Fed, Ben Bernanke, argumentou que o banco central americano não estava se envolvendo em “desvalorizações competitivas” semelhantes às ocorridas na década de 1930, mas que pretendia tão somente garantir a solidez do sistema bancário americano, indispensável para a continuidade da retomada da economia mundial. A ausência dessa retomada causaria maior mal às economias emergentes do que os efeitos colaterais resultantes do aumento da liquidez internacional.
Se essas são as verdadeiras intenções dos banqueiros centrais do primeiro mundo, cabe aos países emergentes adotar medidas macroeconômicas apropriadas para mitigar os efeitos colaterais da excessiva liquidez internacional sobre as suas economias.
Os instrumentos para essa prática estão disponíveis à maioria dos países afetados pelas políticas do Fed e do BCE e, agora, pelo BoJ. Primeiro, políticas macroprudenciais similares às que já pusemos em prática em passado recente; segundo, restrições à entrada de fluxos de capitais, incluindo a taxação dos rendimentos desses investimentos, como nós e também outros países já praticaram.
Como apontou o professor Eichengreen, é de todo desejável que os países emergentes sigam o exemplo do Brasil no emprego de tributos para evitar-se o excesso de ingresso de capitais estrangeiros. E que os países emergentes tomem medidas adequadas, consistentes com as suas instituições financeiras e monetárias, para salvaguardar seus interesses. Só assim o duplo objetivo da retomada da economia mundial e de evitar-se desvalorizações competitivas será de fato atingido.(DC)