Exploração de gás e petróleo pode danificar áreas de preservação, dizem especialistas
A Agência Nacional do Petróleo irá leiloar 92 blocos para exploração e produção de petróleo e gás natural nas bacias de Campos, Pelotas, Potiguar e Santos na próxima quinta-feira (7).
A inclusão de um dos blocos disponíveis na Bacia Potiguar está gerando polêmica e provocando críticas de especialistas. O bloco em questão fica muito próximo a três unidades de conservação e áreas de alta sensibilidade ambiental: o Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha, a Área de Proteção Ambiental em seu entorno e a Reserva Biológica do Atol das Rocas, entre as costas do Rio Grande do Norte e do Ceará.
A possibilidade de leilão para exploração nessa região já provocou reação de diversas autoridades ao longo do ano, e teve, inclusive, um laudo técnico realizado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) que não recomendava a inclusão do bloco. Em uma nota técnica disponível na página da 17ª rodada da ANP, o instituto afirmou ser “temerária” a inclusão dessa área por causa da proximidade com Noronha e Atol das Rocas, ambos berçários naturais.
Especialistas ouvidos pelo g1 explicam os riscos não só ambientais, mas também socioeconômicos que a exploração pode levar à região.
Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recurso Renováveis (Ibama) explica que as regiões são de alta sensibilidade ambiental e com muita riqueza biológica.
“Qualquer petróleo nessas regiões vai atrapalhar o equilíbrio ambiental. Qualquer perturbação de atividades humanas pode matar toda a vida que está lá. Essas áreas têm importância ecologica de manutenção da biodiversidade, mas também da manutenção do modo de vida das populações tradicionais”, diz. Entre as espécies que podem ser impactadas na região, estão as baleias azuis.
Ela também aponta os problemas que podem ser causados pela água de produção (que é usada na exploração e jogada de volta ao mar). “Tem uma série de padrões de óleo e graxa que precisam ser obedecidos para que voltem ao mar. Mas, por mínimos que sejam as quantidades destas substâncias, elas causam um estrago grande em áreas de fragilidade ambiental”.
O professor Luis Enrique Sanchez, da Escola Politécnica da USP, afirma que, durante as atividades de exploração sem as devidas informações, “podem acontecer impactos diretos no fundo do mar e afetar áreas que abrigam uma quantidade de seres vivos”. Para Sanchez, também é importante levar em conta a possibilidade de acidentes com vazamento de petróleo e quais areas seriam atingidas antes de uma ação de contenção do vazamento. Especialmente em uma região tida como muito importante em termos de biodiversidade.
De acordo com o ICMBio, a proximidade entre o bloco e as reservas ambientais pode ser nociva por quatro motivos: “a propagação por longas distâncias de ondas sísmicas, a grande mobilidade de algumas espécies marinhas, a ação das correntes marítimas sobre a propagação do óleo e o histórico de invasão de espécies às atividades de exploração de petróleo e gás”.
Avaliação Ambiental de Área Sedimentar
Um dos pontos centrais da polêmica envolvendo a exploração de blocos na Bacia Potiguar passa pela Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS). “Essa avaliação é um tipo de estudo ambiental, inclusive feito de forma similar em outras partes do mundo, para antecipar as consequências de uma perfuração”, explica o professor Sanchez.
Suely Araújo também critica a falta da avaliação. O problema foi apontado por ambientalistas e pela Associação Nacional de Advogados Animalistas (Ana) em uma ação pública que visa impedir a realização da licitação. A ação foi impetrada em 24 de setembro na Justiça do Distrito Federal e foi enviada para a Justiça Federal de Pernambuco na última sexta (1º).
Araújo explica que essa avaliação levaria em conta o impacto ambiental e socioeconômico causado em toda a área da bacia. A ANP substituiu a AAAS por um parecer do Ministério do Meio Ambiente e, com isso, “ignorou riscos à população e à biodiversidade brasileira”, diz um trecho da ação impetrada em setembro.
“A AAAS deveria ter sido feita na fase de planejamento prévio, somaria todo o impacto, olharia as áreas mais frágeis e as excluiria do leilão. Eles afirmam que o licenciamento ambiental vai resolver. Mas como o Ibama terá condições de trabalhar normalmente e barrar a exploração se o governo já contratou? Imagina a pressão que vai ser para o técnico do Ibama negar uma área já licitada”, diz Araújo.
A falta desta análise mais detalhada também levou à ausência de estudos e simulações em casos de acidentes durante a exploração do petróleo. A Bacia Potiguar não será a única da rodada a sofrer impactos ambientais, afirma a especialista. Ela diz que técnicos também apontaram problemas em blocos na bacia de Pelotas, no Rio Grande do Sul. “Se ocorrerem acidentes, vai atingir todo o litoral de Santa Catarina, que vive de turismo e pesca”, avalia.
Histórico de ações
Em março, o Instituto Internacional Arayara entrou com uma ação civil pública na Justiça Federal em Pernambuco para suspender o leilão da Bacia Potiguar.
Em abril, o deputado Túlio Gadelha (PDT) entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender o leilão.
Rodada
Segundo a Agência Nacional de Petróleo (ANP), a 17ª Rodada de Licitações de Blocos para exploração e produção de petróleo e gás natural tinha, até setembro, nove empresas inscritas. São elas:
- 3R Petroleum Óleo e Gás S.A;
- Petrobras;
- Chevron Brasil Óleo e Gás Ltda.;
- Shell Brasil Petróleo Ltda.;
- Total Energies EP Brasil Ltda.;
- Ecopetrol Óleo e Gás do Brasil Ltda.;
- Murphy Exploration & Production Company;
- Karoon Petróleo e Gás Ltda;
- Wintershall Dea do Brasil Exploração e Produção Ltda.
Caso seja realizado o leilão, serão ofertados 92 blocos com risco exploratório, com área total de 53,93 mil quilômetros quadrados.
Eles estão localizados em 11 setores “de elevado potencial e de nova fronteira de quatro bacias sedimentares marítimas brasileiras: Campos, Pelotas, Potiguar e Santos”, segundo texto do site da ANP.
(G1)