Divergências marcam debate sobre inclusão de serviço de streaming na lei de TV paga
Representantes dos principais grupos de radiodifusão, de telecomunicações e plataformas digitais do País compareceram à audiência pública da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados para discutir o Projeto de Lei 4292/19, que pretende assegurar que os serviços idênticos aos de TV por assinatura distribuídos pela internet estejam sujeitos às mesmas regras da TV paga.
Essas regras estão previstas na chamada Lei de Serviço de Acesso Condicionado (SeAC), que estabelece, entre outros pontos, cotas de conteúdo nacional para os canais e pacotes. Apresentado pelo deputado Paulo Teixeira (PT-SP), o PL 4292/19 altera essa lei para incluir os serviços ofertados pela internet.
O debate foi sugerido pelo deputado Cezinha de Madureira (PSD-SP) e pelo relator do projeto, deputado Vinicius Poit (Novo-SP).
Poit inicialmente apresentou parecer pela rejeição da proposta, mas recomendando a aprovação de um projeto apensado (PL 4389/19), de autoria do deputado João Maia (PL-RN). Este projeto tem o objetivo oposto: permite a oferta de canal de programação pela internet sem que ele seja enquadrado na Lei do SeAC.
A proposta de João Maia também acaba com a restrição à propriedade cruzada prevista na Lei do SeAC. Hoje, a lei prevê que produtoras de conteúdo detenham no máximo 50% do capital total e votante de prestadoras de telecomunicações; e que prestadoras de telecomunicações detenham no máximo 30% do capital de produtoras e programadoras.
Novo projeto
Porém, posteriormente, mais uma proposta foi apensada (PL 5645/19), e o deputado Vinicius Poit terá que fazer novo parecer aos projetos.
Apresentado pelo deputado Celso Russomanno (Republicanos-SP), o PL 5645/19 prevê, entre outros pontos, que a prestadora do serviço de acesso condicionado, independentemente de tecnologia de distribuição empregada, oferte, sem qualquer custo adicional para seus assinantes, os canais de televisão aberta e os de acesso público, como TV Brasil, TV Câmara e TV Senado. Essa regra – conhecida como must carry – já é cumprida pelas operadoras de TVs por assinatura, e a ideia do deputado é que também valha quando o serviço for distribuído pela internet.
Divergências
Na audiência pública, Fábio Augusto Andrade, vice-presidente de Relações Institucionais da Claro, manifestou preocupação com o parecer apresentado. “Temos o PL 4292/19, o PL 4389/19, e o PL 5645/19 e me causa estranheza que o relator cite apenas o PL 4389. Isso me causa perplexidade porque os outros projetos têm pontos importantes a serem considerados”, disse.
Já o diretor de Regulação e Relações Institucionais do Grupo Globo, representando a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Marcelo Bechara, se disse contrário ao enquadramento dos serviços de streaming na Lei do SeAC. Ele acredita que o serviço tem que ter regulação diferente do serviço de TV paga.
O consultor da Motion Picture Association (MPA), Maurício Fittipaldi, também acredita que a distribuição de conteúdo audiovisual por meio de estrutura de telecomunicações – como no caso da TV por assinatura – não pode ser equiparada à distribuição de conteúdo pela internet. A entidade representa a Netflix.
Outra proposta
Já o consultor da área de telecomunicações (e ex-deputado federal) Jorge Bittar, que foi relator da Lei do SeAC na Câmara, acredita que a lei deve ser atualizada para englobar a distribuição de conteúdo audiovisual pela internet e que essas plataformas também devem apoiar a produção e distribuição de filmes e séries brasileiros.
Bittar defende outra proposta (PL 8889/2019, também do deputado Paulo Teixeira), que já foi aprovada na Comissão de Cultura, na forma de texto substitutivo, e agora também será analisado pela Comissão de Ciência e Tecnologia. O substitutivo obriga distribuidoras de conteúdos audiovisuais formatados em catálogo, como Netflix e Amazon Prime Video, a investir anualmente pelo menos 10% do seu faturamento bruto em produções nacionais.
Propriedade cruzada
Na audiência, Roberto Franco, representante do SBT, disse ser contrário à retirada das restrições de propriedade cruzada do texto da Lei do SeAC sem que outro mecanismo de promoção da competição seja criado. Ele defendeu o must-carry no serviço de audiovisual prestado pela internet.
Essa mesma posição foi defendida pelo representante da Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abratel), Samir Nobre: “Foi feito algum estudo do que essa revogação das restrições de propriedade cruzada trará para os brasileiros? Desconhecemos qualquer estudo sobre os benefícios que a alteração vai trazer para as empresas brasileiras.”
A diversidade de posições ficou ainda mais clara com o posicionamento da gerente de Projetos do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, Marina Pita. Ela disse ser favorável à regulamentação do serviço de streaming, mas se posicionou contra as propostas de regulação que foram discutidas na audiência. O Intervozes defende que haja limites na concentração de mercado.
Reportagem – Lincoln Macário e Lara Haje
Agência Câmara Notícias