Indústria, educação, TI: quem paga mais aos recém-contratados?
Café, laranja, soja, milho, feijão. Esses são os campeões de contratação do primeiro semestre de 2017. A agricultura, responsável pelo crescimento da economia no início do ano – a primeira reação após dois anos consecutivos de recessão -, foi o setor que mais gerou vagas no Brasil nesse período. Foram 117 mil postos de trabalho com carteira assinada, contra 60,7 mil nos serviços e 27,7 mil na indústria.
Não por acaso, entre as dez posições que mais ganharam novas vagas de janeiro a junho, seis estão direta ou indiretamente ligadas ao setor, conforme levantamento feito pela BBC Brasil com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
Foram 26 mil “volantes da agricultura”, antigamente chamados de boias-frias, quase 50 mil trabalhadores no cultivo de café e de árvores frutíferas e 12,8 mil tratoristas.
Apesar da concentração no setor agrícola – onde os contratos costumam ser temporários e a demanda por mão de obra, maior na primeira metade do ano – e dos efeitos negativos da crise sobre o emprego, há oportunidades também fora do campo. Alguns ramos da indústria e dos serviços, por exemplo, não apenas contrataram mais, como estão pagando maiores salários aos recém-contratados.
No topo da lista, o cargo de alimentador de linha de produção gerou 42,5 mil postos formais, quase o dobro do saldo registrado no mesmo período de 2016, 23,9 mil. Quem desempenha essa função atua diretamente nas esteiras das linhas de montagem nas fábricas de alimentos e bebidas, por exemplo, ou abastece o maquinário na indústria da borracha, do plástico, de máquinas e equipamentos e de materiais elétricos.
O salário médio de admissão cresceu 7,3% entre o primeiro semestre do ano passado e o mesmo período deste ano, para R$ 1.257,32.
Santa Catarina foi o Estado que, em termos proporcionais, mais contratou nessa posição. Foram 7,4 mil novos postos com carteira, para um universo de aproximadamente 650 mil funcionários na indústria catarinense. São Paulo registrou número maior de admissões em termos absolutos, 12,9 mil, mas possui um universo bem maior de trabalhadores, de 2,5 milhões.
Algumas das melhores oportunidades para quem procura emprego na indústria do Estado, diz o presidente da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc), Glauco José Côrte, estão no ramo metalúrgico, cuja produção cresceu 22,7% de janeiro a maio.
O salário do ajustador mecânico catarinense avançou 21,7% na comparação com o primeiro semestre do ano passado, para R$ 1.713,30. Na média nacional, a remuneração dos mil novos contratados nessa função, responsável pelos reparos e pela manutenção das máquinas nas fábricas, avançou 15,3%, para R$ 1.542,70.
“Há um sentimento de que tudo está parado, mas isso não é verdade”, diz Côrte, referindo-se à percepção de crise que predomina entre muitos brasileiros.
Maiores salários
A educação está entre os segmentos que mais elevaram os salários de contratação.
Os mil docentes admitidos em universidades pelo país entre janeiro e junho que atuam na área de prática de ensino ganham em média 18,1% mais que os colegas que conseguiram emprego no primeiro semestre de 2016, R$ 2.034,39.
A remuneração dos professores de educação infantil com nível superior, por sua vez, cresceu em média 10,4% na mesma comparação, para R$ 1.827,04. A dos inspetores aumentou 10,6%, para R$ 1.233,86.
Aos 50 anos, a paulistana Ana Lucia Morata Fernandes conseguiu seu primeiro emprego na área em 2017. Ela trabalhou como recepcionista nos últimos seis anos, enquanto fazia faculdade de pedagogia. “Queria muito mudar de emprego e a responsabilidade era minha de correr atrás. Escolhi a carreira por acreditar que não haveria preconceito de idade”, disse ela à BBC Brasil.
A vaga de assistente de sala no colégio Notre Dame Rainha dos Apóstolos, no bairro do Ipiranga, na zona sul de São Paulo, apareceu mais cedo que o esperado, ela conta, depois de seis meses de procura, em um site de anúncio de vagas.
“Apesar de estar começando, meu salário hoje é maior que minha última remuneração”, comemora ela, que trabalha com crianças de 7 a 11 anos.
“Os salários cresceram tanto na área do ensino técnico quanto nos cursos de maior qualificação”, diz o diretor da Catho, Luís Testa. Pesquisa com 13 mil participantes feita em fevereiro pela empresa, que anuncia em seu site cerca de um milhão de vagas por mês, já mostrava essa tendência.
Conforme o levantamento, os professores de cursos profissionais de nível técnico e os de ensino superior, pós-graduação e extensão universitária tiveram em 2017 aumentos salariais de 46% e 39%, nessa ordem.
“As mensalidades foram reajustadas acima da inflação e uma parte disso foi repassada para os professores”, diz o presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado de São Paulo (Sieeesp), Benjamin Ribeiro da Silva, que reconhece que os salários pagos pelo setor, mesmo com o aumento, “ainda não são os melhores do mundo”.
Outro setor que, apesar da crise, segue contratando e pagando melhor do que em 2016 é o de tecnologia da informação. Entre janeiro e junho, foram criadas no país 760 novas vagas para programadores de sistema, com salário médio 10,3% maior que no primeiro semestre do ano passado, R$ 3.326,92.
“As empresas têm dificuldade para encontrar profissionais qualificados, mesmo durante a crise”, diz Kerullen Pimenta de Sá, responsável pela área de recrutamento e seleção da Adecco, consultoria em recursos humanos que oferece cerca de 500 vagas por mês.
Além de programadores, as empresas que procuram a Adecco para preencher os quadros de funcionários buscam administradores de banco de dados, engenheiros de sistemas, consultores de TI especializados. “Essa é uma área em que as empresas também investem para se tornar mais eficientes”, acrescenta Felipe Bolzoni, gerente da unidade de São Paulo.
Onde estão as vagas?
Não faltam perguntas como essa na página do Facebook do Ministério do Trabalho. A cada novo post de divulgação de um resultado positivo do Caged, a caixa de comentários fica recheada de relatos de meses de desemprego e da falta de oportunidades nas grandes cidades.
A queixa tem fundamento. Entre os dez municípios que mais demitiram nos primeiros seis meses de 2017, nove são capitais: Rio de Janeiro, Fortaleza, Recife, Salvador, Porto Alegre, Belo Horizonte, Maceió, Manaus e Florianópolis. O Rio de Janeiro teve o pior resultado, com corte de 41,1 mil postos de trabalho com carteira assinada, seguido por Fortaleza, com 10,5 mil demissões líquidas.
A geração de emprego se concentrou fora dos grandes centros urbanos. Na lista dos dez municípios que mais criaram vagas formais, há, por exemplo, as paulistas Matão e Bebedouro, que se destacam pela produção de laranja, e as cidades gaúchas Santa Cruz do Sul e Venâncio Aires, grandes produtores de tabaco. O primeiro lugar é de Franca, polo calçadista paulista, com 6 mil postos com carteira assinada no período.(G1)