Estudo prevê extinção de espécies de plantas nativas no cerrado
Isso gera problemas ambientais de diversas naturezas. A crise hídrica que a região Centro-Oeste e o Distrito Federal passam no momento seria agravada pela perda da cobertura do cerrado e também haveria a emissão de gases de efeito estufa de 8,5 bilhões de toneladas de CO2 (gás carbônico).“Isso tudo seria consequência direta do desmatamento projetado para os próximos 30 anos”, diz.
Strassburg, secretário-executivo do Instituto Internacional para a Sustentabilidade (IIS) e coordenador do Centro de Ciências para a Conservação e Sustentabilidade da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), destaca que o cerrado é um hotspot mundial de biodiversidade (região biogeográfica que é simultaneamente uma reserva de biodiversidade e pode estar ameaçada de destruição).
A razão para isso é que, no cerrado, há 4.600 espécies de plantas endêmicas, que não existem em nenhum outro lugar do planeta. Os pesquisadores projetam um quadro preocupante de extinções de grande magnitude em 30 anos, se nada for feito.
Eles estimam que até 1.140 espécies seriam condenadas à extinção pelo desmatamento acumulado do cerrado neste período. “Esse é um número oito vezes maior do que todas as espécies registradas como extintas no mundo até hoje”. Desde que os registros começaram, por volta do ano 1500, 139 espécies de plantas foram registradas oficialmente como extintas.
Mix de políticas
A mensagem positiva da pesquisa é que esse quadro pode ser evitado sem comprometer o aumento de produção agrícola programado para ocorrer no cerrado, que atinge em torno de 15 milhões de hectares de expansão de soja e cana-de-açúcar nos próximos 30 anos.
Segundo Strassburg, o Código Florestal Brasileiro estima que os fazendeiros terão que restaurar 6 milhões de hectares do cerrado, o equivalente a 6 milhões de campos de futebol, caso queiram ficar em conformidade com a lei. O artigo da revista mostra, ainda, que restaurar 6 milhões de hectares de vegetação nativa já é bom, mas se isso for feito nas áreas otimizadas para a proteção das espécies, se conseguirá evitar 83% desse quadro projetado.
“Ou seja, se você expande a agricultura para áreas já desmatadas e restaura o cerrado nas áreas mais importantes para as espécies, você consegue evitar 83% do quadro projetado”, diz o pesquisador.
O estudo cita um conjunto de oito políticas públicas e privadas que já existem, algumas estão em operação no próprio cerrado, algumas na Amazônia, como é o caso da Moratória da Soja, por exemplo, que deveriam ser estendidas para o cerrado e focadas no problema da extinção das espécies de plantas nativas.
“Esse mix de políticas poderia ser suficiente para evitar esse quadro”. Seria necessário, apontou o coordenador, um esforço concentrado para que essas políticas sejam coordenadas entre si e financiadas da forma apropriada. Ele afirmou que o apoio político e financeiro à causa ambiental vem diminuindo ano a ano.
Financiamento
Além da chamada Moratória da Soja, implantada na Amazônia, que praticamente eliminou a conversão direta de áreas de floresta para o cultivo da soja na região, as políticas em vigor incluem a expansão da rede de áreas protegidas, uma vez que o cerrado tem hoje menos de 10% de sua área protegida em unidades de conservação. Strassburg diz que seria importante também o aumento do financiamento para conservação, inclusive verbas oriundas de projetos de combate às mudanças climáticas.
Além disso, há uma série de políticas nacionais, estaduais e municipais diretamente focadas na preservação de espécies ameaçadas, que devem ser fortalecidas. Ele citou ainda o plano de agricultura de baixo carbono, do Ministério da Agricultura, que poderia ser implementado em escala maior, tendo a preocupação de orientar a expansão da soja e da cana para áreas já desmatadas e melhorar a pecuária em outras áreas.
Para tudo isso funcionar, Strassburg afirma ser essencial que haja um planejamento espacial estratégico para identificar as áreas que são prioritárias para a conservação e para restauração da vegetação nativa e as áreas onde a expansão da agricultura teria menor impacto ao meio ambiente, além de serem boas para a atividade agrícola.
O estudo conta com a parceria dos ministérios do Meio Ambiente (MMA) e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. “O nosso maior papel é fazer essa ponte entre pesquisa de ponta e política pública”.