Doenças negligenciadas serão debatidas em simpósio
Chagas, malária, dengue, leishmanioses, tuberculose. Mais de um bilhão de pessoas em todo o mundo são afetadas por essas e outras doenças negligenciadas sendo que, apenas no Brasil, a estimativa é de 144 milhões de doentes. Na próxima semana, entre os dias 23 a 25 de novembro, representantes da indústria farmacêutica, universidades nacionais e internacionais e laboratórios oficiais, estarão reunidos na Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP para o quarto Simpósio de Planejamento e Desenvolvimento de Fármacos para Doenças Negligenciadas.
Já entre os dias 25 e 27, haverá o 12° Encontro Nacional de Professores de Química Farmacêutica, evento complementar ao simpósio e que vai abordar metodologias inovadoras na pesquisa de moléculas com potencial para se tornarem, no futuro, novos medicamentos.
“Chamamos de doenças negligenciadas pois a indústria farmacêutica precisa investir mais de 1 bilhão de dólares para produzir um novo medicamento e, nas populações atingidas, geralmente os fármacos são doados pelo governo, mas a maioria desses países ou não são bons pagadores ou não têm dinheiro para bancar o investimento”, explica a coordenadora geral do evento, a professora Elizabeth Igne Ferreira, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP.
Para a professora Elizabeth, o principal problema é a ausência de força política dessas populações. “Elas convivem com pobreza, conflitos e violações de direitos humanos. Já a hipertensão ou o HIV atingem pessoas de todas as classes sociais”, compara.
Tríplice hélice
Entretanto, esse quadro tem mudado. Segundo a docente, cada vez mais as indústrias farmacêuticas investem em pesquisas no setor. “É a chamada tríplice hélice, como descreveu a pesquisadora Nubia Boechat, da FioCruz: muitas multinacionais já estão se unindo com universidades, instituições oficiais e organismos como o Drugs for Neglected Diseases initiative (DNDI), uma rede internacional que realiza pesquisas sobre o tema, na busca por alternativas farmacológicas. “É a open inovation: as indústrias estão se abrindo para as universidades, em busca de inovação”, diz. Um dos objetivos do encontro é exatamente reunir esses diversos atores em busca de soluções efetivas envolvendo essas doenças.
Entre os laboratórios oficiais que irão fazer apresentações no simpósio estão a FioCruz, o Adolpho Lutz, e o Lafepe (Laboratório Farmacêutico de Pernambuco, responsável pela produção do benznidazol, medicamento para doença de Chagas utilizado no Brasil), entre outros.
A palestra de abertura será do pesquisador Alain Fairlamb, do Drug Discovery Unit, ligado à Universidade de Dundee, na Escócia, um centro de pesquisas que é um exemplo de como integrar forças entre a academia, as instituições de pesquisa e a indústria com o objetivo de chegar às soluções medicamentosas. Além do DNDI, haverá também pesquisadores da Medicines for Malaria Venture (MMV), consórcio formado por várias instituições internacionais do setor. Da indústria farmacêutica, participa a representante da GSK, da Espanha.
Entre as universidades, haverá a presença de pesquisadores da USP, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), além de representante da Universidade da Califórnia em San Diego, e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Vale da morte
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), existem atualmente em todo o mundo 17 doenças negligenciadas. O Brasil é atingido por nove delas: leishmanioses, Chagas, malária, tuberculose, filariose (elefantíase), esquistossomose, dengue e hanseníase, entre outras. A maior incidência está localizada nos estados no norte e nordeste. “No Sul e Sudeste a incidência é menor, entretanto é onde mais se concentram as pesquisas pois há maior investimento”, comenta a pesquisadora. Esse quadro de incidência reflete o que ocorre no mundo: os casos estão concentrados em países mais pobres como os da região central do continente africano, na China e na Índia.
A professora Elizabeth lembra que, devido às migrações, muitos países desenvolvidos já apresentam casos de doenças negligenciadas. Canadá, sul dos Estados Unidos, alguns países da Europa, e também, alguns da região do Pacífico Ocidental são alguns.
Outro problema é que um novo medicamento pode demorar de 10 a 15 anos para chegar ao mercado. De 1975 a 2004, foram desenvolvidos 1.535 medicamentos para outras doenças e apenas 18 são para doenças tropicais (3 para tuberculose). Já de 2000 a 2011, surgiram 756 novos medicamentos, sendo 29 para doenças negligenciadas e apenas 4 para tuberculose ou malária. “Estimativas apontam que, de 10 mil moléculas com potencial, apenas uma vai dar origem a um novo fármaco, pois ao longo dos ensaios pré-clinicos, muitas delas apresentam alta toxicidade ou baixa absorção e são descartadas. É o que chamamos de “vale da morte” “, informa.
Nobel
Mas há um ponto bastante positivo: o último Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina contemplou cientistas envolvidos em pesquisas ligadas às doenças negligenciadas: a chinesa Tu Youyou, da Academia Chinesa de Medicina Tropical, realizou estudos com a artemisinina, um dos fármacos mais modernos contra a malária. E os pesquisadores William C. Campbell, da Drew University in Madison, nos Estados Unidos, e Satoshi Omura, da Kitasato University, no Japão, pesquisaram a avermectina, fármaco que apresentou bons resultados para tratar a elefantíase e a oncocercose (cegueira do rio).
As palestras ocorrerão no auditório “Profa. Maria Aparecida Pourchet Campos” (Auditório Verde) da Faculdade de Ciências Farmacêutica, na Av. Prof. Lineu Prestes, 580 – Bloco 13A, piso superior, Cidade Universitária, São Paulo.
A programação completa está disponível nos sites: http://event-ndmc.wix.com/simpdn e http://event-ndmc.wix.com/enpqf (USP)