Por que mentimos para nós mesmos?
São muitos os estudos científicos que já mostraram que as pessoas que mentem para si próprias podem ser mais bem-sucedidas em áreas de negócios e esportes, e ainda têm chances de serem mais felizes do que aquelas que preferem ser honestos consigo mesmas.
Mas será que existe algum lado ruim no autoengano?
Um engenhoso estudo realizado por Zoe Chance, professora da Escola de Administração da Universidade Yale, nos Estados Unidos, testou essa ideia.
Ela e seus colegas realizaram uma série de experimentos pedindo para estudantes responderem a um teste de QI e a outro de conhecimentos gerais.
Metade dos participantes recebeu uma folha com as perguntas que também exibia as respostas, parecendo para eles que se tratava de um erro dos examinadores.
Esses voluntários, portanto, teriam a chance de checar suas respostas conforme completavam o exame. Como era de se esperar, alguns deles não resistiram à tentação e foram observados “colando”.
Coletivamente, o grupo que teve acesso às respostas foi melhor nos testes do que aquele que recebeu o questionário sem as soluções impressas – apesar do fato de todos os participantes terem sido selecionados aleatoriamente entre alunos da mesma universidade e, portanto, com uma capacidade intelectual semelhante.
Aumento da autoconfiança
A equipe de Chance passou então à seu questionamento mais fundamental: será que as pessoas do grupo que trapaceou sabiam que estavam confiando nas respostas impressas, ou será que atribuíram seu sucesso apenas à sua própria inteligência?
A maneira como os pesquisadores testaram isso foi perguntar aos estudantes para predizer o quanto se sairiam bem em um teste subsequente. Eles poderiam dar uma olhada rápida nas novas perguntas, de maneira a verificar que se tratavam de questões parecidas e que, desta vez, as respostas não estavam impressas no papel.
Os pesquisadores esperavam que quando os voluntários que “colaram” soubessem que não teriam a chance de fazer isso dessa segunda vez, eles diriam que não se sairiam bem no novo teste.
Não foi bem assim. O autoengano acabou prevalecendo. De maneira geral, aqueles que tiveram acesso às respostas na primeira rodada previram que iriam tirar notas ainda melhores no segundo exame. Mas quando testados, claro, eles pontuaram bem menos.
Chance e os demais estudiosos realizaram mais um experimento para verificar se o efeito realmente estava relacionado com a percepção exagerada do trapaceiro sobre sua própria capacidade.
Desta vez, os alunos foram avisados de que receberiam um prêmio em dinheiro se conseguissem prever com precisão suas notas no segundo teste. Novamente, aqueles que colaram superestimaram suas habilidades e ganharam menos dinheiro que os outros.
Custos e benefícios
Isso significa que os participantes dos experimentos de Chance – pessoas comuns, provavelmente como você e eu – se enganaram a ponto de se verem mais inteligentes do que realmente eram.
É possível reconhecer alguns benefícios em se fazer isso, principalmente no que se refere à autoconfiança, à satisfação e a conquistar mais facilmente a confiança dos outros.
Mas também há desvantagens. Quando as circunstâncias mudam e você precisa prever como se sairá, pode custar caro pensar que é melhor do que realmente é.
Isso também traz implicações interessantes. Moralmente, a maioria de nós diria que o autoengano é algo ruim. Mas é normal que ele esteja presente em nós em alguma medida.
O autoengano, portanto, não é algo muito bom quando vem em doses altas. Na maioria das vezes, ele serve a um propósito quando seus benefícios compensam os custos.
Todos nós provavelmente nos enganamos a nós mesmos até certo ponto. Mas a ironia é que não sabemos com que frequência o fazemos.
(BBC)