Por que essa Copa do Mundo está tão boa?
Virou quase consenso. Que Copa legal! Quantos jogos bacanas! Que maravilha essa fartura de gols! Fale com argentinos, italianos, sérvios ou nigerianos. A opinião é sempre no mesmo tom. As pessoas estão gostando deste início de Mundial basicamente porque ele está extremamente ofensivo. Copas do Mundo costumam ser amarradas, chatas. A cautela goleia a ousadia. Ninguém quer se expor muito, principalmente nas primeiras rodadas.
Por que diabos, então, estamos vendo essa tempestade de gols? Claro que é cedo para conclusões definitivas, mas podemos nos arriscar em teorias mirabolantes. Aqui vai uma. A Copa do Mundo está desse jeito porque estamos vivendo uma “desbarcelonização” do futebol. Hã?
Vamos aprofundar isso. Há sete ou oito anos, o Barcelona começou a dominar o futebol mundial com a lógica de que o toque de bola cura tudo. A seleção espanhola foi na mesma toada e expandiu o domínio catalão. Tudo dominado, em clubes e em seleções. Toca pra cá, toca pra lá, enquanto você está com a bola o adversário não tem o que fazer. Dentro dessa mesma lógica, quanto menos você arrisca o passe, mais chance de permanecer com a bola e anular qualquer ação do rival. O tique-taque do Barcelona influenciou o planeta-bola. Todos tentando ficar o maior tempo possível com a bola. E arriscando pouco, ou nada. Quanto menos qualidade técnica, menos ainda se arrisca. Menos risco, menos jogadas perigosas, menos gols, menos tesão.
O Bayern de Munique talvez tenha sido o porta-voz da boa nova. Propôs um jogo vertical, arriscado, ofensivo e goleou o Barcelona na Liga dos Campeões. Deixou a mensagem no ar. Havia outra forma de triunfar no futebol. Mais gente passou a fazer o mesmo. A ideia seguiu no ar. E veio a Copa.
Já nos primeiros jogos, o estilo agressivo apareceu. Mesmo seleções humildes como a Costa Rica não abriram mão de tirar uma casquinha e partiram para o ataque franco. Jogando bem ou jogando mal, todo mundo tentou o gol. O gol marcado parece que ganhou mais valor do que o gol não sofrido. Posse de bola deixou de ter a importância dos últimos anos. A Espanha, na estreia, teve mais tempo de bola que a Holanda. E os laranjas deixaram a Roja vermelha de raiva com os 5 x 1.
Velocidade virou a chave desse novo-velho futebol. Contra-ataques fulminantes, mais gente se arriscando na correria. Sim, porque correr loucamente sem a bola é risco puro. Risco de pregar no segundo tempo e perder a partida. Pode não ser nada disso, e a fartura de gols terminar na semana que vem. Tomara que não. O jogo do Barcelona tinha, evidentemente, sua beleza. Toques qualificados, categoria, elegância. O jogo vertical e apressado carrega suas imperfeições. Mas não estávamos mesmo um tanto cansados desse jogo engomadinho dos espanhóis?
Sérgio Xavier
(Veja)