Empresária da Ilha de Itaparica- BA denuncia descaso e irresponsabilidade na saúde pública local
Ao
Ministério Público Federal
DENÚNCIAS – SAÚDE PÚBLICA – MUNICÍPIOS DE VERA CRUZ E ITAPARICA
Após diversas tentativas de solucionar a questão junto aos responsáveis diretos pela demanda em âmbito estadual e municipal da gestão do sistema de saúde pública nos municípios de Vera Cruz e Itaparica, venho por meio desta, solicitar providências do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em relação aos graves problemas existentes nos referidos municípios.
A ILHA DE ITAPARICA é uma das Ilhas que compõe a Baia de Todos os Santos, localizada a 13 kms da capital, Salvador, é composta por dois municípios, Vera Cruz e Itaparica. Embora exista esta divisão administrativa a Ilha de Itaparica é conhecida e reportada como uma só entidade. O deslocamento da população para a capital é feito através de transporte marítimo realizado das 6 hs da manhã até às 23:30, em travessias que duram em média 50 minutos. Após o último horário de saída das embarcações o único meio de chegar a capital é através da rodovia percorrendo 280 kms. Os municípios contam cada um com um hospital. Em Vera Cruz, município que conta com a gestão plena na saúde, tem 87% da extensão territorial, com aproximadamente 37 mil habitantes, com 27 localidades (bairro s), conta com um único HOSPITAL, o MARIA AMÉLIA SANTOS com sérias limitações de atendimento emergencial. A prefeitura municipal adquiriu o direito de administrar o hospital antes da iniciativa privada, mas que já fazia atendimento ao pelo SUS colocando o mesmo em reformas e por mais de 01 ano deixou de realizar até mesmo partos, pois suspendeu totalmente os atendimentos. Os profissionais da área de saúde, em sua imensa maioria precisam se deslocar de Salvador para trabalhar na Ilha e por este motivo os atendimentos noturnos são ainda mais prejudicados pela ausência dos mesmos que retornam às suas casas na capital. Os municípios contam com os serviços do SAMU com 03 ambulâncias e alguns postos de saúde com atendimentos precários.
Citarei abaixo alguns exemplos recentes dos quais participei em busca do socorro aos pacientes.
Na maioria das vezes o SAMU transporta os pacientes para o HOSPITAL GERAL DE ITAPARICA que conta com mais opções em atendimento de especialidades e que, apesar de ser conhecido como unidade de referência para os dois municípios carece até mesmo de equipamentos essenciais ao atendimento a exemplo do cardio-desfibrilador que, pela falta deste, vitimou o paciente FÁBIO DE JESUS SANTOS, 32 anos, morador da Barra do Gil em Vera Cruz, portador de anemia falciforme, já fazendo hemodiálise, vítima de AVC deu entrada no HGI em 05/11/2012 por volta das 7 hs onde permaneceu sem o monitoramento adequado até as 18 hs quando faleceu após parada cardíaca.
Em decorrência da extrema deficiência do hospital Maria Amélia Santos em Vera Cruz é comum buscar socorro médico em Itaparica no HGI, como foi o caso do paciente DAVID PACHECO, morador do bairro da Gameleira em Vera Cruz, internado no HGI com leptospirose em 05/11/2012. A morosidade em obtermos a vaga no Hospital Couto Maia para o tratamento adequado deste jovem de 34 anos causou a sua morte poucos dias depois.
A senhora MARIA SANTANA MARQUES, 75 anos, cardiopata, diabética, hipertensa, estava em veraneio na cidade de Vera Cruz quando desmaiou e foi levada para o HGI de onde foi removida para Salvador após o socorro prestado pelo helicóptero do GRAER PIS naquele dia, 01 DE JANEIRO DE 2011 a única ambulância disponível no município de Vera Cruz era EMPRESTADA pelo município de São Francisco do Conde. È do conhecimento do prefeito municipal o aumento da população flutuante na Ilha no período de alta estação (verão) e bem maior para os festejos de virada do ano sendo desta forma, inadmissível a falta de planejamento do gestor público para que as pessoas tenham atendimento médico básico emergencial ou de urgência em caso de necessidade.
Em março de 2012 foi a vez do jovem FELIPE SANTOS BRITO ter o seu quadro clínico agravado pela precariedade de atendimento e dificuldade de transferência do mesmo para a capital. Faltavam ambulâncias nos dois municípios. Vítima de uma tentativa de assalto, o jovem foi levado para o HGI onde permaneceu por horas até obter o seu traslado para Santo Antonio de Jesus onde faleceu.
Em 02/12/2012 outro jovem trabalhador, MARCELINO BATISTA, morador da localidade da Barra do Gil, foi vítima de acidente de moto. Levado para o HGI por volta das 15 hs., permaneceu no referido hospital por mais de 18 horas quando, após intervenção de diversas pessoas, conseguiu ser transferido para o Hospital Geral do Estado com quadro de TETRAPLEGIA, já apresentando de bradicardia e insuficiência respiratória. Permanece internado até esta data em tratamento.
Em 03 de fevereiro de 2013 o Sr. PEDRO JOSÉ DA PENHA, morador da Barra do Gil em Vera Cruz, sofreu infarto agudo do miocárdio e foi levado para o HGI onde permaneceu por dias em busca de vaga através da central de regulação do Estado para sua transferência para um hospital especializado em cardiologia. Vaga esta que nunca chegou. Apesar da tentativa de oferecer ao paciente um tratamento digno, os médicos do referido hospital não podem disponibilizar o atendimento necessário em virtude da falta de equipamentos e leitos apropriados. O Sr. Pedro permaneceu por dias numa enfermaria sem monitor cardíaco, sem acompanhamento profissional permanente apesar do risco de novo infarto.
Em 18/02/2013 dois menores, FELIPE CONCEIÇÃO PIEDADE e EDVAN TEIXEIRA, vítimas de acidente em Vera Cruz, no bairro do Porrãozinho, foram levados para o HGI, mais uma vez por não poder contar com os serviços do hospital de Vera Cruz. Chegando em Itaparica, diante da gravidade do caso era preciso a transferência dos garotos para uma unidade hospitalar em condições de ofertar atendimento adequado pois apresentavam fraturas expostas e um deles sofreu perfuração em um dos olhos. Mais uma vez foi grande o desespero dos familiares, pois não havia nenhuma ambulância disponível na cidade. Como as crianças eram moradoras de Vera Cruz a família pediu socorro na UPA em Vera Cruz e obteve como resposta que, a única ambulância disponível no município estava em atendimento na cidade de Salva dor.
Quero mostrar que, apesar do município de Vera Cruz estar em gestão plena no setor da saúde pública, não vem investindo ao longo de anos na melhoria da qualidade de atendimento dos seus munícipes. Pacientes portadores de doença renal crônica são obrigados a enfrentar todo o constrangimento e sofrimentos ocasionados pela falta de embarcações no sistema ferry boat. Apesar da existência do programa TFD (tratamento fora do domicílio), nunca vimos o prefeito municipal levantar a bandeira em defesa destas pessoas que em sua maioria são carentes e costumam viajar sem ao menos uma refeição decente, enfrentam horas nas filas para embarque, quando tem a disponibilidade de embarcações, passam horas sob os efeitos do tratamento e retornam para a cidade enfrentando os mesmos transtornos e di ficuldades. Não existem serviços de ortopedia, serviço para atendimento emergencial cardiológico e muitas vezes não disponibiliza de ambulâncias para socorro.
É preciso uma intervenção urgente no sentido de averiguar as necessidades da população e a capacidade de atendimento dos hospitais de Vera Cruz e de Itaparica de forma que estes possam cumprir com o seu papel garantindo o direito à vida dos moradores daquela região.
Lenise Mirian Ferreira de Andrade / Cardiopata, portadora de marca-passo cardíaco.