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É ético ferver as lagostas vivas?

lagosta na panela
Na última quarta-feira, um estudo publicado no Journal of Experimental Biology reacendeu um debate que é caro tanto a biólogos quanto a defensores dos direitos dos animais e apreciadores da alta gastronomia: os crustáceos, em especial as lagostas, são capazes de sentir dor? 
A resposta é importante porque crustáceos, como lagostas e caranguejos, são os ingredientes principais de diversos pratos e iguarias consumidos pelo mundo afora. Métodos comuns de preparo desses animais incluem atirá-los em água fervente ou arrancar partes deles, tudo isso enquanto ainda estão vivos. Em restaurantes, é comum que os crustáceos fiquem em aquários, para serem escolhidos pelo consumidor e, assim, consumidos ainda frescos.
Pois o estudo, realizado com caranguejos-verdes (Carcinus maenas), concluiu que esses animais são capazes de sentir dor. “Bilhões de crustáceos são capturados ou criados para atender à demanda da indústria agroalimentar. Em comparação com os mamíferos, eles não gozam de quase nenhuma proteção sob a única presunção de que não podem sentir dor. Nossas pesquisas sugerem o contrário”, resumiu Bob Elwood, biólogo da Universidade Queen’s em Belfast,  na Irlanda.
Durante o experimento, noventa caranguejos foram colocados, um de cada vez, em um tanque iluminado, no qual havia dois abrigos, simulando os locais escuros entre as pedras nos quais eles costumam se esconder quando estão na natureza. Quando escolhiam um dos abrigos, localizados em pontas opostas, metade dos animais recebeu um choque. Depois de algum tempo de descanso, eles foram colocados de volta no tanque. A maioria deles escolheu novamente o mesmo abrigo, o que os fez levar outro choque. A partir da terceira vez em que foram colocados no tanque, porém, e nas outras sete que se seguiram, a maior parte dos caranguejos escolheu o outro abrigo, de modo que deixaram de receber os choques.
Ética de pesquisa – Não são apenas os cozinheiros que “não pensam na lagosta” (para inverter o título do ensaio de David Foster Wallace). Pesquisas científicas realizadas com essas espécies geralmente não precisam passar pela aprovação de uma comissão que avalia os cuidados com os animais.
A Diretriz Brasileira de Prática para o Cuidado e a Utilização de Animais para Fins Científicos e Didáticos (DBPA) e a Lei nº 11794, de 2008, que estabelece procedimentos para o uso científico de animais, considera como animal qualquer vertebrado vivo não humano, das espécies classificadas no filo Chordata, subfilo Vertebrata. “Isso significa que a legislação em vigor no Brasil não é relativa a animais invertebrados (como os caranguejos e insetos), mas apenas a espécies pertencentes aos grupos dos peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos”, afirma Marcelo Pinheiro, biólogo marinho da Unesp São Vicente.
Volpato, que realiza diversas pesquisas com peixes, explica que, apesar de ser aplicada a todos os vertebrados, a legislação é muito mais voltada para mamíferos. “É o mesmo que dizer que a legislação de diretos humanos só vale para pessoas que não são índias”, diz.
Para o pesquisador, a intensificação da luta pelos direitos dos animais, que ocorre desde a década de 90, apesar de ser positiva, gerou situações contraditórias. “Se eu vou fazer uma pesquisa com peixes, tenho que passar por uma comissão que vai avaliar cada procedimento ao qual o animal será submetido, mas se eu sou pescador, posso fazer os peixes sofrerem à vontade.” Ele explica que mesmo pescarias nas quais os peixes são devolvidos ao mar depois de fisgados são prejudiciais, pois causam sofrimento aos animais apenas para o entretenimento.
“Quando se trabalha com produção animal você tem que entender que é necessário matar alguns animais para alimento. Mas a gente deve causar o mínimo de sofrimento possível. Só que existe sofrimento desnecessário”, afirma.
(Veja)

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