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Pesquisa mostra difusão das notícias falsas no WhatsApp em grupos de família

A partir daí, ele iniciou uma caça aos boatos, estudando sua propagação em tempo real. Para cada pessoa que havia recebido uma corrente, perguntava de quem havia recebido a mensagem antes, com o objetivo de chegar à origem e verificar se o texto foi encaminhado a outras pessoas.

Em seu experimento, no contexto de total silêncio da imprensa no país, Simon identificou 13 diferentes notícias ou rumores circulando pelo WhatsApp, dos quais 9 eram verdadeiros, ou seja, cumpriram o papel de informar durante aquele vácuo de informação. As outras quatro que não eram verdadeiras, diz ele, tinham 70% de “conteúdos verdadeiros”.

“Isso é algo que se deve levar em conta: as notícias falsas se aproveitam de elementos verdadeiros para enganar as pessoas. Se um elemento é verdadeiro, ele pode validar o resto, conectando com as crenças e valores de quem lê a notícia. O elemento falso preenche um buraco, costurado a informações verdadeiras.”

Com seu experimento, Simon conseguiu encontrar três fontes diferentes dos boatos que circularam na rede: duas das fontes eram jornalistas e um era amigo da família de um dos garotos sequestrados. Nem todos os boatos eram falsos.

Mas o WhatsApp, diz ele, é a rede “perfeita” para começar a disseminação de notícias falsas porque é considerado muito mais confiável. “Você recebe informações no WhatsApp de pessoas em que costuma confiar mais”, afirma.

Ele também cita a chamada “Basking in reflected glory” (algo como regojizar por meio da glória alheia), um conceito da psicologia social segundo o qual as pessoas tendem a se associar com pessoas bem-sucedidas para se sentirem bem-sucedidas também. Assim, ao transmitir uma mensagem com informações exclusivas, o transmissor se sentiria vitorioso e bem-conectado, sugere Simon.

Para solucionar o problema da boataria desenfreada, o pesquisador israelense sugere campanhas para que o público leia as informações de forma crítica. Além disso, sugere que instituições de credibilidade criem grupos no WhatsApp para disseminar notícias verdadeiras. Ou então que as instituições se coloquem como referência no aplicativo para que usuários mandem notícias para elas e, assim, elas verifiquem as informações enviadas – algo como um bunker de notícias falsas, só que ao contrário.

Boatos sobre o zika

A circulação de boatos no WhatsApp e no Facebook, no Brasil, já foi estudada pelo jornalista Marcelo Garcia, que trabalha na Fiocruz. Em seu mestrado, pesquisou sobre a circulação de notícias falsas relacionadas à epidemia de zika em 2015 e 2016.

As duas situações – notícias sobre zika e sobre Marielle – foram muito distintas, ele ressalta. Os boatos sobre zika se proliferaram em um contexto em que era tudo muito novo: ninguém tinha informações concretas sobre a ligação entre zika e microcefalia, nem pesquisadores nem imprensa. Era difícil checar informações ou publicar respostas a dúvidas porque, muitas vezes, a resposta era “não sabemos”.

Mas ele traça paralelos entre as duas situações, como a da tendência que ele observou de usuários que compartilham notícias com as quais já concordam ou que corroboram suas crenças. “Colocamos as crenças antes dos fatos. É algo que pode acontecer nas eleições”, observa.

Garcia também acha que o WhatsApp é uma mídia mais fácil para compartilhar boatos. “Na questão da Marielle, também teve isso, ainda mais em um contexto polarizado”, diz. “Você acaba repassando aquilo para reforçar determinado ponto de visto em um grupo do qual participa.”

Para ele, outra característica importante do boato é que não tem autor ou fonte. “A legitimidade vem da fonte que enviou a notícia”, afirma – e, normalmente, quem envia mensagens no WhatsApp são pessoas conhecidas, de confiança.

Ele analisou quatro boatos sobre zika que circulavam no WhatsApp e analisou comentários da página da Fiocruz, da Folha de S.Paulo e do Diário de Pernambuco. Chegou à conclusão que os boatos tinham três “grandes critérios”: 1) o desconhecimento em torno da própria doença; 2) a desconfiança em relação às autoridades políticas e a falta de confiança no sistema de saúde no Brasil, de que o sistema daria conta da epidemia; 3) a desconfiança em relação à ciência em geral.

“O que a gente estudou parece mostrar que precisamos estar mais atentos não só aos boatos que estão circulando, mas também às questões e dúvidas da população”, diz ele. “É uma lição que tem que ficar. É preciso repensar a forma como se comunica com a população”, afirma.(G1)

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