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Danos ambientais em Arembepe são debatidos em audiência na ALBA

A construção de um conjunto residencial numa área de preservação ambiental em Arembepe, no Litoral Norte baiano, foi tema de audiência pública realizada na manhã de ontem (20), na Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA). Promovida pela Comissão Especial de Promoção da Igualdade, presidida pelo deputado Bira Corôa (PT), a audiência teve a participação de representantes da comunidade e do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema). Convidadas para o evento, a Prefeitura e Câmara Municipal de Camaçari não mandaram representantes, assim como o Ministério Público Estadual (MPE).
Apesar de ter recebido a licença ambiental da Prefeitura de Camaçari, o conjunto residencial Luar de Arembepe tem cometido uma série de infrações, conforme os depoimentos dos representantes do município na audiência. O próprio Bira Corôa, ao abrir o evento, apresentou uma extensa lista de irregularidades que teriam sido cometidas pelo empreendimento, que também não mandou representantes para audiência, apesar do convite feito pelo colegiado.
De acordo com Bira, a construção do condomínio já está afetando a vida dos moradores de três comunidades tradicionais de Arembepe – Sangradouro, Caraúna e Vilarejo. “São comunidades formadas por pescadores artesanais, marisqueiras e barraqueiros de Arembepe”, explicou o deputado,  lembrando que isso  justifica a realização da audiência pela Comissão de Promoção da Igualdade. “Não somos contra os empreendimentos implantados no litoral de Camaçari, mas este em específico vem infringido os direitos das comunidades de Arembepe, sobretudo as tradicionais, sem falar nas questões ambientais, que são de grande gravidade”, acrescentou o parlamentar petista.
RIO CAPIVARA
O presidente do colegiado explicou que a área onde está sendo construído o conjunto residencial Luar de Arembepe é formado por dunas, vegetação de restinga e por duas lagoas consideradas estratégicas para a saúde do Rio Capivara: Lagoa Grande e Santa Maria. Essas lagoas, segundo Bira, armazenam o fluxo de água das chuvas, ajudando a abastecer de forma gradativa o Rio Capivara nos períodos de seca. “Eles estão construindo pistas, edificações, aterrando nascentes e suprimindo a vegetação da área”, afirmou ele.
As lagoas, conforme os relatos feitos durante a audiência, são consideradas estratégicas para aves migratórias, como garças, quero-queros e marrecos, que vêm se reproduzir no Litoral Norte da Bahia. Algumas dessas espécies vêm de locais muito distantes como o Canadá, conforme explicou Bira Corôa. “Por isso essa área é de preservação permanente”. Essas aves, observou ele, se alimentam nas lagoas de camarões de água doce, ainda abundantes na região.
O drama vivido pelas comunidades tradicionais foram ilustradas na audiência pelo representante da ONG ambiental Coqueiro Solidário, Rivelino Martins de Souza, cuja família vive há gerações na região. Ele se emocionou ao lembrar que a mãe de 90 anos ajudou a sustentar a família com os mariscos coletados nas lagoas agora ameaçadas. “Quantos umbigos de filhos de Arembepe  foram enterrados nesse lugar?”, lamentou Rivelino. Segundo ele, desde meados da década de 80, todos as gestões impugnaram a implantação de empreendimentos  nessa área, até a liberação ambiental dada pelo prefeitura de Camaçari para construção deste conjunto.
Rivelino lembrou o grande número de artistas que veio para Arembepe no final da década de 60, atraídos pela exuberância da natureza do lugar, agora ameaçada pela especulação imobiliária. E citou Paulo Coelho, Glauber Rocha (“que filmou lá”), Cláudio Marzo, Betty Faria, Pepeu e Baby,  além de  estrelas internacionais como Janis Joplin. “Nesta época, Arembepe era o paraíso dos hippies, um destino comparado a Machu Picchu e Santiago de Compostela”, exemplificou.
Também presente na audiência, a representante da Associação Comunitária do Litoral Norte, Fabiana Franco, lamentou que até hoje Arembepe não tem o básico, que é um sistema de esgotamento sanitário. “Onde o esgoto desse loteamento será despejado?”, questionou. Ela levantou outra questão: a falta de um estudo sobre o impacto da vizinhança na comunidade. Isso porquê, ao contrário de outros empreendimentos do Litoral Norte, os lotes do residencial Luar de Arembepe comercializados são pequenos, de 10 por 16 metros, o que deverá provocar um grande adensamento populacional na região.  Sem falar nos impactos no turismo. “Como o turista vai visitar a Aldeia Hippie com o Rio Capivara poluído”, acrescentou ela.
FISCALIZAÇÃO
O chefe de gabinete do Inema, Welton Luiz Rocha, explicou que técnicos do órgão ambiental do Governo do Estado fizeram uma vistoria na área, no último dia 8, e preparam um relatório que deve ser divulgado nos próximos dias. Segundo ele, apesar da concessão da licença ambiental ser responsabilidade da Prefeitura de Camaçari, é o Inema quem fiscaliza o uso dos recursos hídricos na Bahia, o que inclui qualquer intervenção nas lagoas e o destino do esgotamento sanitário. “Se for constatado que está havendo intervenções nas lagoas, o Inema poderá embargar totalmente ou parcialmente a obra”, informou o representante do Instituto do Meio Ambiente.
O problema, conforme relataram os representantes de Arembepe, é que pelo ritmo acelerado das obras, pouco restará a ser preservado se a intervenção demorar para acontecer. O Ministério Público do Estado, outra instituição que poderia intervir, ainda não tomou nenhuma iniciativa para barrar o empreendimento. “O promotor de Justiça de Camaçari, Luciano Pitta, assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) vergonhoso e sem o conhecimento dos moradores de Arembepe”, reforçou Fabiana Franco. A deputada Maria del Carmen (PT), presidente da Comissão de Desenvolvimento Urbano da ALBA, estranhou a omissão do MPE.  “O Ministério Público tem uma função de fiscalização importante aí, até mais do que o próprio Inema”, acredita ela.
No final da audiência, os deputados decidiram que vão realizar uma visita ao local, reunindo representantes das três comissões: Promoção da Igualdade, Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente. Decidiram também aguardar a apresentação do relatório do Inema e ver se de fato a obra será embargada ou não. “Além disso, vamos dar todo suporte para que a comunidade continue mobilizada para impedir que os danos ambientais não sejam irreversíveis em Arembepe”, afirmou Bira Corôa.

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