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Pequenos delitos, grandes multas tão grave que a penalidade chega a R$ 880,41

Um dos principais é transitar por marcas de canalização
Não vai fazer mal. Está tudo engarrafado mesmo, não é? Qual é o problema de passar por cima das linhas brancas diagonais no chão? Afinal, elas estão mesmo tomando o espaço de praticamente uma faixa da via. É o espaço de um carro – e por que não ocupá-lo?

Pode ser sincero: você já deve ter pensado exatamente isso. Talvez, já tenha, inclusive, feito – e passado por cima das chamadas marcas de canalização, essa sinalização horizontal que indica o fluxo de tráfego numa rua, direcionando por onde os veículos devem ou não seguir. O que talvez você não saiba é que essa infração não é apenas ‘uma bobagem’: considerada gravíssima pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB), ela triplica o valor da multa desse tipo (que é de R$ 293,47) – ou seja, três vezes o valor de uma infração gravíssima comum, chegando a R$ 880,41.

Dentre as infrações deste tipo, ela é a mais cometida pelos motoristas em Salvador, de acordo com a Transalvador. Em 2017, 2.275 condutores foram autuados por esse ‘pequeno delito’. Este ano, só até a primeira semana deste mês, 396 já foram flagradas pelos agentes de trânsito. Mas, como essa infração, o que não falta é gente cometendo outras atitudes consideradas por muitos como ‘leves’, mas condenada pelo CTB – que ainda prevê uma penalidade tripla.

É o caso de quem transita com o veículo em calçadas ou passeios (1.474 motoristas no ano passado; 206 já em 2018); de quem dirige em cima de ciclovias e ciclofaixas (1.345 autuações em 2017 contra 139 até agora, este ano) e até mesmo de quem transita com velocidade 50% do que a máxima permitida pela via (970 condutores no ano passado e 124 este ano).

Para o superintendente da Transalvador, Fabrizzio Muller, não tem desculpa para quem comete essas infrações. “São regras básicas de circulação. É algo que o condutor tem obrigação de saber, uma vez que ele foi avaliado e teve que estudar para tirar a CNH (Carteira Nacional de Habilitação)”, afirmou.

O superintendente defende que há dois tipos de situação – quando os motoristas de fato não sabem que estão cometendo uma infração e quando os condutores até sabem, mas continuam agindo deliberadamente contra as normas do CTB.

Segundo ele, o órgão de trânsito tem feito campanhas nas redes sociais divulgando informações básicas. “Em alguns casos, as câmeras ajudam a flagrar essas situações, como, por exemplo, transitar em ciclofaixas ou em passeios. Em outros casos, são os agentes mesmo”.

Além de pagar uma multa de R$ 880,41, o condutor que for autuado por esse tipo de infração vai receber sete pontos na carteira. No entanto, a notificação poderá ser contestada diante dos órgãos de trânsito – como acontece com qualquer outra infração.

Mudança nas leis
Mais do que o prejuízo no bolso, essas infrações devem ser entendidas como um desrespeito ao espaço de outros participantes do trânsito – como pedestres e ciclistas, na avaliação do coordenador de fiscalização de veículos do Departamento Estadual de Trânsito da Bahia (Detran-BA), capitão Márcio Santos

E, muitas vezes, essa saída da fila numa tentativa de encurtar o caminho acaba gerando até mais problemas para o fluxo do trânsito. Segundo Santos, quando um veículo tenta fazer isso e disputa espaço com outros carros, acaba provocando um novo bloqueio ou lentidão na via. “De uma forma egoísta, o condutor antecipa o local para disputar o espaço com as outras pessoas, mas acaba aumentando ainda mais o engarrafamento”.

Só que a vida dos condutores não é fácil – um dos desafios, para o presidente da Federação Nacional das Associações de Detran (Fenasdetran), Mário Conceição, é justamente a legislação. O CTB tem 341 artigos e mais de 700 resoluções. Para ele, é difícil acompanhar todas as mudanças.

“Às vezes, mexem na resolução que já foi mexida, então não chega lá na ponta, no cidadão. Tem especialista de trânsito que está hoje dando uma palestra e quando vê, já saiu uma resolução que alterou tudo. Isso faz com que o cidadão comum passe a desconhecer”, aponta.

Ainda assim, ele acredita que a maior parte das atitudes indevidas no trânsito é provocada, principalmente, pelo ‘jeitinho’ e pela sensação de que aquilo não vai ter consequências. “A educação é um problema, porque você tem a aula no período que vai tirar a permissão e depois passa anos e não volta a assistir esse tipo de palestra”.

Alta velocidade
Numa viagem de volta de Itacaré, após o feriado de Finados, em novembro, o engenheiro civil Gabriel Gonçalves, 64 anos, ultrapassou a velocidade permitida na BR-101. Pouco depois, recebeu a cartinha que informava sobre a infração gravíssima com a justificativa de que tinha passado, em 50%, o limite da rodovia. Passou a fazer parte, assim, dos que precisam arcar com uma infração gravíssima com um valor três vezes maior.

No caso dele, o problema não foi o desconhecimento da lei. O engenheiro até reconhece que estava acima de velocidade – em um trecho de 100 km/h, ele acredita que tenha chegado a pouco mais de 120 km/h. “Vou recorrer justamente porque não sei se estava a 150 km/h. Vou começar a recorrer agora de todas. Estou com umas três no carro”, contou ele, que encontrou o CORREIO no setor de contestação de multas da Transalvador, nos Barris, na quinta-feira (8). Tinha ido apresentar recurso contra uma notificação que levou nas ruas da cidade, por trafegar com velocidade 20% acima do permitido.

Para ele, os limites de velocidade não são mais compatíveis com os carros disponíveis no mercado. “Os valores das multas também são muito caros e você não vê sinalização efetiva. Multa não educa ninguém, só deixa zangado. Eu sei qual é a velocidade na qual me sinto seguro”.

De acordo com a chefe substituta do núcleo de comunicação da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Silviane Marcele, mesmo nas estradas, é mais comum que os motoristas excedam a velocidade em 20% em relação ao limite da rodovia – ao invés de 50%. “Essa não é a mais recorrente, mas a gente encontra mais do que gostaria”.

Nas rodovias federais, os limites de velocidade são expressos em placas e até pela própria legislação de trânsito. “O excesso de velocidade é um fator muito grave. Por isso, a gente sempre pede que, ao pegar uma rodovia federal, que o motorista se prepare, tenha um descanso e vá sem pressa, porque a velocidade não vai ajudar, só vai acarretar mais acidentes”.

Invasão de ciclofaixas desestimula uso de bicicletas, diz coordenador do Detran
A imprudência de motoristas que invadem ciclovias e ciclofaixas também custa caro – é uma dessas infrações gravíssimas que chega a R$ 880,41. Mesmo assim, de acordo com o criador do grupo de cicloativismo Jabutis Vagarosos Valci Barreto, isso não diminui o desrespeito ao espaço das bicicletas.

“A invasão de motociclistas e motoristas nas ciclofaixas é a coisa mais comum. Eles não respeitam nada que não seja certeza de multa. Nós temos motoristas desrespeitosos tanto em relação aos sinais de trânsito como em relação às pessoas. Se eles olharem e não verem um guarda, eles não vão respeitar aquela faixa e isso vale para o trânsito em geral”, diz.

Para o coordenador de fiscalização de veículos do Departamento Estadual de Trânsito da Bahia (Detran-BA), capitão Márcio Santos, a atitude dos motoristas diante das faixas reservadas aos ciclistas também é um reflexo do egoísmo no trânsito.

“No caso dos ciclistas, esse é um dos motivos que desestimulam as pessoas a andar de bicicleta nas ruas, reduzindo a poluição – e tudo por conta do desrespeito dos motoristas às regras de trânsito”, pontua.

Dirigir sem habilitação é infração comum no interior
No interior do estado, uma das infrações gravíssimas mais comuns nas estradas é que condutores que não têm habilitação estejam no volante, segundo a chefe substituta do núcleo de comunicação da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Silviane Marcele. Por este delito, a multa também é multiplicada por três e chega aos R$ 880,41.

“A gente se depara muito com isso. Não sei se é por ser uma questão financeira, porque uma habilitação hoje envolve um valor razoável para uma pessoa que ganha um salário mínimo, por exemplo. E tem aquela questão do pai que deixa o filho dirigir até a esquina sem carteira, depois deixa mais um pouquinho”, explica. Hoje, somente em uma autoescola, o valor do serviço fica em torno de R$ 1,6 mil, em Salvador. Além disso, o futuro motorista precisa comprar um laudo no Detran por R$ 168.

Também é comum encontrar, nas abordagens das PRF, motociclistas com habilitação suspensa ou cassada. Para Silviane, muitos condutores não entendem os perigos das estradas. “É preciso entender que o trânsito é uma arma, que mata quase igual uma guerra. É como se o cidadão não tivesse internalizado ainda que o veículo é uma arma e que algo muito grave pode acontecer”.

Ainda assim, as infrações mais comuns nas rodovias federais são as ultrapassagens em locais indevidos. “Esse tipo de infração é o que acarreta o acidente mais letal que existe, que é a colisão frontal. Existe a sinalização frontal das rodovias, mas quando o veículo não obedece essa sinalização, ele não tem visibilidade do que está vindo no sentido oposto”, diz, citando, ainda, os motoristas que dirigem após consumir bebida alcóolica.(Correio)

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