Conheça o exame que pode melhorar em até 50% os tratamentos de câncer
No imaginário popular, o câncer tem uma forma bem definida: o tumor é como uma bola, que se instala em um órgão e vai se tornando cada vez maior. Na prática, a doença se manifesta de várias formas, e detectá-la precocemente é a melhor possibilidade de cura e um trabalho que requer atualização constante. Foi com essa meta que, em 2009, o Hospital Mãe de Deus, em Porto Alegre, adquiriu e instalou o primeiro equipamento de PET/CT na região Sul do país. Desde então, a equipe do hospital já acompanhou mais de 12 mil casos de câncer com esta tecnologia de imagem. Sobre a experiência, a gestora do serviço, Dra. Clarice Sprinz, afirma: “O PET/CT é uma ferramenta poderosa no diagnóstico do câncer”. Prova disso é que seu resultado altera o plano de tratamento contra o tumor em 30 a 50% casos.
Ela cita como exemplo o uso do equipamento no intervalo entre ciclos de quimioterapia, para avaliar o resultado. “Antes, sem o PET/CT, era necessário terminar o tratamento para só depois avaliar se tumor havia respondido. Ou seja, perdia-se muito tempo, sem falar nos custos emocionais e econômicos envolvidos na manutenção de um tratamento ineficiente.” Com o uso do PET-CT, é possível detectar precocemente se o tratamento está funcionando ou não e, caso não esteja, mudar rapidamente a abordagem, em busca de armas mais eficazes contra o tumor.
Um exame, duas tecnologias
O grande diferencial do PET/CT é somar, num só exame, duas tecnologias diferentes, que oferecem informações distintas e complementares sobre o câncer, possibilitando um maior conforto ao paciente que realiza tudo em uma única sessão de imagem. Enquanto a tomografia traz os dados sobre a anatomia dos órgãos, a localização, o tamanho e a forma, o PET indica o funcionamento bioquímico celular, gerando informações muito sensíveis sobre a função e o potencial maligno das lesões. Duas informações que, somadas, geram um diagnóstico mais acurado e precoce, e, consequentemente, um tratamento mais eficaz.
Para entender como a tomografia funciona, pense em um exame de raio-X. Assim como a radiografia pode mostrar se um osso está ou não quebrado, por exemplo, a tomografia utiliza radiação para produzir imagens bi ou tridimensionais dos órgãos. Assim, é possível identificar se há alguma alteração anatômica, como a presença de um tumor. Já o PET/CT usa uma estratégia diferente. No começo do exame, o paciente recebe via injeção uma substância que emite pósitrons (elétrons que, em vez de carga negativa, têm carga positiva) e repousa por cerca de uma hora. Depois, é avaliado pelo PET/CT, que detecta em que áreas do corpo esses pósitrons se acumularam mais.
No caso do câncer, o PET/CT utiliza o FDG (fluorodeoxiglicose) como carro chefe – um análogo da glicose ligado a um elemento radioativo capaz de emitir pósitrons. Essa escolha tem como base o fato de que, em muitos tipos de câncer, as células tumorais consomem mais glicose (que funciona como combustível para o crescimento do tumor) do que as células normais. Esse apetite extra faz com que elas capturem mais FDG e, por isso, apareçam com destaque no PET – mesmo que a alteração ainda seja pequena e não tenha levado a nenhuma modificação anatômica importante detectável pela tomografia, ultrassom, RX ou ressonância magnética. Ou seja, enquanto a tomografia pode mostrar a forma e localização de um tumor, o PET pode apontar se células de câncer já alcançaram outros órgãos, mesmo que esse processo de metástase ainda esteja no início. “Com a fusão destas duas imagens, houve um grande progresso na forma como avaliamos a extensão do espalhamento do câncer e de como o tratamos atualmente” afirma a Dra. Clarice Sprinz.
Diagnóstico número um para linfoma de Hodgkin
Nem todos os tipos de câncer, porém, se mostram igualmente ávidos por glicose – e, consequentemente, por seu análogo, o FDG. Por isso, hoje o PET/CT é mais eficiente em alguns casos do que em outros. A primeira área em que a tecnologia se mostrou comprovadamente vantajosa foi no diagnóstico e tratamento do linfoma. Hoje, o PET/CT é o método-padrão para acompanhamento de linfoma de Hodgkin e linfoma não de Hodgkin, afirma o Dr. Heitor Sado, médico assistente do InRad – Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicas da USP, em São Paulo.
O SUS cobre o uso do PET/CT em três situações: linfomas de Hodgkin e não de Hodgkin, câncer colorretal com metástase hepática e câncer de pulmão. Já os planos de saúde cobrem, além desses três casos, o uso de PET/CT para avaliação de nódulo pulmonar solitário, câncer de cabeça e pescoço, melanoma, câncer de esôfago e câncer de mama (quando há metástase).
Quando uma pessoa tem um nódulo solitário no pulmão, mas não se sabe se está ou não com câncer, o PET/CT pode ser usado para substituir a biópsia, afirma Sado. Ou seja, o equipamento permite que o diagnóstico seja feito de maneira muito menos invasiva. Se for comprovado que o paciente tem câncer no pulmão, o PET/CT pode avaliar de forma mais precisa se há ou não metástase, o que ajuda a definir o tratamento que será adotado.
Câncer de esôgafo, cabeça, pescoço e mama
Da mesma forma, esta tecnologia permite estabelecer a estratégia inicial de tratamento contra câncer de esôfago, e quando há tumor de cabeça e pescoço. Já no caso do câncer colorretal, o exame é indicado especialmente quando há uma recidiva da doença ou se ela passou para o fígado (metástase hepática). “Antes, quando o paciente tinha essa metástase, ele não era mais candidato a tratamento cirúrgico. Hoje, se o PET/CT mostrar que o câncer está no fígado, mas não em outros locais do corpo, vale a pena operar o paciente”, afirma o Dr. Sado. Em outras palavras, o paciente tem chance de ser curado.
Em relação ao câncer de mama, os métodos padrão (como mamografia e ultrassonografia) são suficientes quando a doença está em estágio inicial. Porém, se houver metástase, o PET/CT ajuda a avaliar a extensão da doença. Depois, permite acompanhar se o tratamento proposto está fazendo efeito ou não. Princípios parecidos são adotados quando o paciente tem melanoma. Existem ainda outros tumores em que o uso do PET/CT pode ser muito útil, mas que ainda não constam no rol da ANS e do SUS. Segundo o Dr. Sado, o aparelho tem grande potencial no atendimento a pessoas com câncer de pâncreas, ovários, mieloma múltiplo e na maioria dos sarcomas. Dra. Clarice Sprinz acrescenta a essa lista o câncer de colo de útero e tireoide indiferenciado.
Atualmente, os linfomas correspondem a mais ou menos 32% de todos os casos de neoplasias avaliadas, segundo a estatística de atendimentos de PET-CT no Hospital Mãe de Deus. Em seguida vêm os casos de câncer de pulmão (17%), colorretal (15%), e melanoma (7%). Vale destacar que o desenvolvimento de novos marcadores pode levar à detecção de novos tumores via PET/CT. O câncer de próstata, por exemplo, não consome muita glicose e, portanto, não acumula FDG. Mas pesquisadores têm buscado um marcador específico para esse tipo de doença, de modo que o problema também possa ser detectado pelo aparelho.(revistagalileu)