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‘Férias-zero’ são tendência nos Estados Unidos

Nos Estados Unidos, o 7 de setembro deste ano também foi feriado – mais especificamente o Dia do Trabalho no país – ao contrário de mais de 80 outras nações, a data não é celebrada em 1o de Maio. Trata-se de uma data que marca o fim do verão e que, para muitos americanos, também leva a reflexões sobre como eles ainda tiram menos dias de férias que pessoas em outros países.
Os americanos não contam com férias garantidas por lei. Empregadores oferecem dias livres – uma média de 12, segundo um estudo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) -, mas pesquisas mostram que quatro entre 10 pessoas escolhem não tirar todo o período oferecido.

“Cultura”

Trabalhar longas horas faz parte da identidade coletiva americana, ainda que a mesma OCDE mostre que o país não está sequer entre os 10 mais em termos de horas per capita anuais. Muitos americanos têm orgulho do “suor extra”. E uma enquete online feita pela BBC corroborou essa hipótese. “Não somos preguiçosos” ou “Somos trabalhadores” foram comentários comuns, mas entre os mais de mil posts registrados na página da BBC News no Facebook também estavam reclamações sobre a cultura das longas horas.
“Americanos morrem de medo de não encontrar seu emprego quando voltarem das férias”, afirmou Steve Drury.
Em conversas com internautas, a BBC descobriu que não falta vontade para gozar de férias, mas que o estigma de “preguiçoso” persegue quem não se conforma com uma rotina de trabalho mais intensa. Gerald Audet, por exemplo, tem um doutorado em medicina e trabalhou em três laboratórios diferentes nos últimos três anos. Em todas as empresas, esperava-se que pensassem em trabalho 24 horas.
“Não fale sobre outras coisas que você faz da vida, pois as pessoas simplesmente olham para você de lado e veem isso como uma fraqueza”, explicou Audet, que gosta de praticar triatlo nas horas vagas.
Em seu atual emprego, ele pode tirar férias, mas acaba trabalhando dobrado antes e depois de sair.
“Essa é a América. Espera-se que você dê tudo de si. Senão, você fracassou”.

Atletas

Mas nem sempre foi assim. John de Graaf, ativista da rede Take Back Your Time, que luta por mais tempo livre para trabalhadores, conta que em 1910 o então presidente americano, Howard Taft, propôs um esquema de três meses de férias para todos os trabalhadores. No entanto, a proposta esbarrou no lobby das empresas e até hoje os americanos são o único país industrializado do mundo sem férias remuneradas mandatórias.
Isso faz com que muitos americanos hesitem em parar de trabalhar. Alaine Megan, por exemplo, não tem férias há três anos. Ela é massagista e acabou precisando de fisioterapia depois de começar a sentir dores pelo corpo.
“Atletas treinam duro, mas têm de descansar no dia seguinte. Todo mundo precisa de um descanso para recuperar as energias. Eu posso fazer meu trabalho melhor depois de férias”.
Já Thomas Ditmar precisou ser diagnosticado com câncer de medula para mudar a maneira como se relacionava com o trabalho. Suas últimas férias tinham sido em 2008, quando viajou com a mulher para a Europa Oriental. Tinha direito a 20 dias de férias, mas a crise global daquele ano afetou o quanto ele queria ficar longe do trabalho.
“Quando a economia desabou em 2008, muita gente foi demitida”, explica Ditmar. “Quem ficou estava grato por ainda ter um emprego, e a empresa sabia disso”.
Cientistas da Universidade John Hopkins disseram à BBC que não existe correlação conhecida entre estresse, exaustão e câncer, mas o médico de Ditmar pediu a ele que reduzisse o ritmo de trabalho.

Ilimitadas

“Henry Ford um dia disse que as pessoas trabalham para ganhar um salário ou medo de perder o emprego. A maioria das pessoas o faz pela última razão”, disse Ditmar.
Uma nova tendência no mercado de trabalho americano é a oferta de “dias ilimitados de férias”. Ryan Zane, um recrutador para empresas do Vale do Silício, disse à BBC que muitas empresas start-up oferecem este benefício porque não têm caixa suficiente para pagar férias caso funcionários deixem seus empregos.
“Na realidade, apenas um em cada cinco funcionários nessas situações realmente tira férias e os que fazem tiram menos de duas semanas. Há muita pressão para a entrega de projetos”.
Em Boston, a empresa de software HubSpot adota um esquema de férias ilimitadas desde 2010. No ano passado, dois funcionários tiraram três semanas para ver a Copa do Mundo no Brasil.
“Queremos repensar como vivemos e trabalhamos. Distanciar-se do trabalho pode ajudar a solucionar um problema em um projeto que antes parecia impossível”, explica Katie Burke, uma das vice-presidentes da empresa.
Muitos americanos disseram à BBC que têm medo do que vão encontrar quando voltam ao trabalho das férias. A profissional de comunicações Betsy Rizzo, por exemplo, contou que terminou trabalhando por horas a fio na volta como forma de “mostrar serviço”.
“Há a ideia de que para progredir você precisa sempre estar trabalhando e que não tirar férias dá vantagens. É a noção de que sua identidade é sua posição profissional”.
John de Graaf vai mais fundo:
“Americanos falam frequentemente sobre liberdade, mas como se pode ser livre sem passar tempo fora do trabalho”, questiona.
(BBC)

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