É dose de juros
O economista José Júlio Senna, chefe do Centro de Estudos Monetários do Ibre/FGV, avalia que nos últimos dois meses houve uma forte mudança de postura do Banco Central no combate à inflação. Isso aconteceu a partir do momento em que o governo passou a ter mais dificuldade na condução do ajuste fiscal, com votações apertadas no Congresso, menor apoio político e queda na arrecadação. Diante disso, o BC repensou o ciclo de alta dos juros.
— Desde o anúncio de Levy para a Fazenda, o mercado apostou num ajuste fiscal forte, com ênfase no corte de gastos. Quando esse cenário ficou menos provável, aumentou a desconfiança. O BC, com medo de perder a condução das expectativas, adotou um discurso mais duro, indicando uma alta maior dos juros — explicou Senna.
O tarifaço da energia elétrica foi subestimado tanto pelo mercado quanto pelo Banco Central. Isso também ajuda a entender os motivos da alta maior da Selic agora. Em janeiro, o Boletim Focus estimava inflação de 6,56% para 2015. Hoje, prevê 8,39%. Já o BC só viu que o problema existia no Relatório de Inflação de março, quando subiu sua estimativa para 7,9%. Até dezembro, acreditava que o IPCA deste ano seria de 6,1%. O risco de uma taxa tão alta é que ela chegue à casa dos dois dígitos e dificulte ainda mais a recuperação da economia no ano que vem.
— Minha projeção é de IPCA entre 8,5% e 9% este ano, mas isso com um ciclo maior de alta nos juros. Se o BC não tiver mão firme agora e não conseguir conduzir as expectativas, a inflação pode perfeitamente ir a dois dígitos — disse José Júlio Senna.
O economista prevê que ainda haverá muitas revisões para baixo no PIB deste ano. Classifica como “freio nas quatro rodas” essa desaceleração e avalia que é fundamental destravar as concessões.
No time da inflação
Uma das dificuldades do BC para baixar a inflação é que desta vez ele não contará com a valorização do real. Em outros momentos, os juros subiram e a nossa moeda se valorizou, ajudando a derrubar os preços. Com o forte déficit em conta-corrente e expectativa de alta dos juros nos EUA, a tendência é que o real se desvalorize.
Erro do passado pressiona a taxa
O gráfico mostra os juros reais no país, ou seja, a taxa nominal descontada da inflação. Em 2012, eles caíram a 1,33%. Na época, o BC apostava em uma nova “taxa de equilíbrio”, que, mesmo baixa, não provocaria inflação. Esse erro passado pressiona os juros reais hoje. A projeção de mercado é de 7,88% para 2015.
Agonia industrial. Depois de três quedas seguidas, O Itaú Unibanco estima nova retração na produção industrial em maio. Os estoques estão elevados, e a confiança, em queda.(Blog da Miriam Leitão)