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Conselho Comunitário: Apresentação

O presente trabalho foi elaborado como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) do Curso de Especialização em Administração Pública realizado pela Universidade Estadual de Feira de Santana em Parceira com a FUNDESP – Escola de Serviço Público, atual fundação Luis Eduardo Magalhães (FLEM) como requisito parcial para obtenção do grau de especialista.
A opção pelo tema “Conselhos Municipais” foi em razão da experiência acumulada pelo autor em atividades junto a entidades do movimento social, ONG’s nacionais e mundiais, universidades e na organização dos trabalhadores rurais e urbanos pela exigibilidade dos direitos individuais e coletivos conquistados na Constituição Federal de 1988. Sem dúvida, a temática da “participação popular nos governos locais é um tema central no processo de consolidação da cidadania e da democracia no país.
Além disso, é preciso adotar o novo paradigma de administração pública previsto na CF/88 colocando no centro da decisão política o cidadão. A reforma administrativa voltada à afirmação da cidadania supõe a implementação de mecanismos de participação popular, contrapondo-se à tendência de privatização e de esvaziamento do espaço público. Neste sentido, a modernização do serviço público implica na participação da sociedade civil na definição das políticas de governo.
As políticas públicas no Brasil, e em especial na Bahia, têm se caracterizado, ao longo do tempo, pela submissão a interesses políticos e econômicos. A elite política brasileira conservadora e oligárquica, sempre teve sua intervenção orientada pelo favor, pelo compadrio e pelo clientelismo, marcando a nossa história econômica e social de práticas assistencialistas que serviam ao fisiologismo e à formação de redutos eleitorais.
É nesse contexto, que a CF de 1988, inaugura uma nova política, quando o legislador constituinte em função das pressões da sociedade civil organizada, propõe como modelo de atuação: A municipalização das políticas públicas, sob argumento de que o município tem melhores condições de prestar assistência social à população, pelo fato de estar mais próximo do povo e mais atento as questões culturais e regionais.
Com a municipalização das políticas públicas, o governo federal, por força da legislação existente, passa a exigir dos municípios a criação de conselhos municipais (de educação, da saúde, loas, etc.) orientados pelo princípio da paridade na sua composição, composto de representantes do município e da sociedade civil organizada (igreja, sindicatos, associações, etc.) visando permitir a participação popular na administração pública.
Os Conselhos de gestão representam uma conquista do processo de democratização vivido pelo Brasil em sua história recente, que resultou da luta da sociedade civil organizada e dos movimentos populares, que contou a contribuição de técnicos do governo (médicos, educadores, etc.) e parlamentares sensíveis às questões sociais.
Com uma formação que prevê a participação de representantes dos vários segmentos sociais, princípio da paridade entre usuários e prestadores do serviço público, os conselhos se tornaram mecanismos de controle, planejamento, implementação e fiscalização das políticas públicas, em campos como a educação, saúde, a assistência social e a área que envolve criança e adolescente. Devido à efetividade de suas ações, e por integrar o próprio texto constitucional, atualmente, eles assumem uma importância crescente como núcleos de participação da população, principalmente de setores excluídos, que dessa forma buscam interferir nas decisões governamentais, em nível federal, estadual e municipal.
Portanto, os Conselhos de Gestão, entre eles os Conselhos municipais, têm hoje em dia uma atuação decisiva no processo de democratização do poder local, da ampliação do controle social sobre a gestão pública e na radicalização da democracia.
Porém, será que os conselhos municipais estão garantindo a efetiva participação popular? Será que realmente estamos conseguindo com esta iniciativa a democratização da gestão da coisa pública? Ou será que permanece o clientelismo e fisiologismo de outrora?
Segundo alguns especialistas, os conselhos de gestão enfrentam vários obstáculos para cumprir suas propostas. Um dos mais significativos é a resistência do poder executivo de expor suas decisões ao debate aberto com a opinião pública. Por esse motivo, há o risco de os conselhos ser alvos de tentativas de instrumentalização por parte de governantes que desejam, muitas vezes, torná-los meros veículos de legitimação de suas políticas. Em outros casos, seu funcionamento é dificultado pela inexistência de condições mínimas de infra-estrutura, ou então suas decisões e propostas simplesmente são ignoradas pela esfera governamental. É preciso encontrar respostas concretas, sob pena de mais uma vez uma conquista popular se perder na ineficiência do Estado.
Além disso, iniciativas como o Programa Comunidade Solidária, que foi articulado pelo governo federal sem a participação da sociedade civil, tentam fazer tábua rasa de conquistas que, apesar de todas as deficiências, foram obtidas pela ação dos conselhos em vários setores.
A discussão deste assunto se torna hoje muito oportuna, para a sociedade civil e para os governos locais na perspectiva de que os espaços criados com os conselhos se tornem efetivos no planejamento, controle social e execução de políticas públicas comprometidas com a construção da cidadania.
Este trabalho pretende estudar este instrumento de participação popular, que são os conselhos municipais, visando dotar a sociedade civil e os executivos municipais de conhecimentos fundamentais a criação e gestão destes conselhos.
“No ano do centenário de Canudos, dedico este trabalho àqueles que insubmissos à iniqüidade e ao despotismo, perseveraram e morreram na luta pelo ideal de fraternidade e igualdade entre os homens.
CARTA DO RECIFE
Os participantes do segundo seminário nacional “Para que Participação Popular nos Governos Locais?”, promovido pelo Fórum Nacional de Participação Popular nas Administrações Municipais em conjunto com a Prefeitura do Recife e com apoio da SUDENE, nos dias 8,9 e 10 de novembro de 1995, tendo em vista as eleições municipais que ocorrerão em 1996, considera importante tornar público uma síntese dos debates travados nesses dias de trabalho:
O cenário internacional, marcado pelo processo de globalização da economia e de fragilização dos Estados Nacionais, coloca uma nova pauta de questões para o poder local, projetando-o no debate político sobre as alternativas de organização do Estado. São principalmente os municípios que estão desafiados a enfrentar mudanças qualitativas nos métodos de gestão pública.
Adotar um novo paradigma de administração pública significa revolucionar por dentro a máquina do Estado, como se organiza e como se presta o serviço público, colocando no centro o cidadão. A reforma administrativa voltada à afirmação da cidadania supõe a implementação de mecanismos e canais de participação popular, contrapondo-se à tendência de privatização e de esvaziamento do espaço público. Neste sentido, a modernização do poder público implica a participação da sociedade na definição das políticas de governo.
A construção de uma nova cultura política democrática, que supere os vícios do autoritarismo, do paternalismo e do clientelismo na relação entre Estado e sociedade, pressupõe a defesa da participação como direito fundamental a cidadania; pressupõe uma nova ética no trato da coisa pública, tanto dos governantes como da sociedade civil, centrada na responsabilidade social, no reconhecimento da diversidade cultural e da pluralidade política dos atores sociais.
Este seminário, ao reunir mais de 300 pessoas de todo o país, representações parlamentares, prefeituras, lideranças de movimentos sociais, de associações de classes, organizações não governamentais e pesquisadores, cuja atuação é decisiva no processo de democratização do poder local, questiona e problematiza as diversas práticas participativas em curso nos municípios. Que avanços podem ser identificados no sentido da ampliação do controle social sobre a gestão pública, na perspectiva de radicalização da democracia?
Considerando que a democracia é um processo em construção, a participação da sociedade local na gestão significa reconhecer:
 O direito igual à participação através da garantia do acesso à informação que, permita a formação e a capacitação do cidadão para intervir na gestão pública;
Que a conjugação entre a participação representativa, que se realiza através do parlamento, e a participação direta da população na gestão fortalece a democracia;
Que a participação da sociedade nos governos locais se realiza através de uma multiplicidade de espaços e mecanismos, pontuais e sistemáticos, de acordo com a realidade de cada município, não se reduzindo apenas a uma só modalidade;
Que é fundamental institucionalizar os canais e mecanismos de participação da população na gestão. No entanto, a legalidade não assegura o processo participativo se não houver vontade política e efetiva partilha de poder;
Que a participação nos canais institucionais não pode substituir a mobilização da população ou outras formas legítimas de pressão da sociedade civil sobre o poder público;
Que é necessário denunciar as iniciativas de formalização da participação social nos governos municipais, quando realizadas com o intuito de respaldar determinado discurso democrático, usado segundo interesses políticos conjunturais de governantes, ou para acobertar interesses corporativos de grupos sociais.
Nessa perspectiva, estão colocados para os diversos atores sociais, os seguintes desafios:
1 – Que os movimentos sociais brasileiros principais atores do processo de democratização do país, resguardem sua autonomia política e assumam cada vez mais um papel propositivo na elaboração das políticas públicas, assim como no acompanhamento e na fiscalização da sua execução.
2 – Que as ONGS comprometidas com a radicalização da democracia no país, invistam esforços na criação de laços de solidariedade e de espaços de diálogo entre as diferentes forças democráticas, organizando processos de sistematização, intercâmbio, análises e formulação de políticas públicas alternativas.
3 – Que as prefeituras se empenhem no processo de democratização administrativa e política da gestão municipal, que abram espaço à participação social nas decisões de governo e resgatem a dívida social legada pelo autoritarismo.
4 – Que os legislativos municipais assumam o papel político de negociador dos principais interesses sociais que envolvem a construção de um projeto global e plural de cidade, constituindo-se efetivamente como espaço aberto, permeável às aspirações da população.
Nessa perspectiva, todos os que estão comprometidos com a democratização do Estado e da sociedade brasileira têm a expectativa de que os candidatos a prefeito e a vereador assumam, como prioridade de governo, a descentralização do poder político, o fortalecimento das representações sociais, a transparência administrativa, a abertura de espaços à participação da sociedade nas decisões, no acompanhamento e na fiscalização das políticas públicas e do orçamento municipal. 
Recife, novembro de 1995”


Jose Claudio Rocha  Âmbito jurídico 

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