Armadilhas para a presidente
Uma das mais coloridas e animadas componentes da ala das baianas do “cordão dos otimistas inveterados” de Brasília – cujo líder, mestre-sala e autor do samba enredo é o ministro da Fazenda, Guido Mantega – a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, desembarcou terça-feira no Congresso Nacional para entoar o principal refrão do bloco: a economia brasileira vai crescer 3,5% este ano.
Não foram necessárias nem 24 horas para o IBGE demonstrar que o samba brasiliense, como se diz no jargão das escolas de samba, atravessou de vez. O PIB do primeiro trimestre de 2013 cresceu só 0,6%, bem abaixo das expectativas do mercado e da prévia do Banco Central com seu IBC-Br apurado há dias de 1,05% para os meses de janeiro, fevereiro de março.
Repetiu-se o número do trimestre passado (todas as comparações dos três meses imediatamente anteriores) e esvaiu-se de vez toda e qualquer veleidade de que se possa chegar ao número pretendido de Mantega e Belchior. O crescimento anual, de abril a março, foi de 1,2%.
Como o IBGE não fechou este pacote ontem nem costuma soltar seus números sem dar um sinal para o Ministério da Fazenda e deste para o Palácio do Planalto, dá para entender por quê, segundo as línguas boas e más de Brasília, a presidente Dilma, de volta de sua viagem a Adis Abeba, estava com o humor um pouco mais azedo que o normal. Imaginava-se então que a irritação presidencial acima de seu conhecido tom habitual estivesse sendo provocada pelas trapalhadas da Caixa Econômica na história dos saques do Bolsa Família e pelas dificuldades com sua base aliada no Congresso, mormente com o “queridinho” PMDB.
Essas coisas incomodam, mas já são quase naturais. Trapalhadas oficiais são frequentes, a Caixa não inovou. Quanto aos aliados, surpresa será o dia que não deixarem uma armadilha no caminho de Dilma. Ela até deve se dar por feliz porque os desacertos, de um modo geral, ainda não afetaram sua imagem, embora já esteja se espalhando nos meios mais informados a sensação de que o governo Dilma é gerencialmente manco.
O PIB – embora ninguém coma o PIB, como dizem os políticos mais cínicos – é outro departamento. Em algum momento a economia patinando pode extrapolar para os principais sustentáculos do prestígio presidencial.
E sob esse ponto de vista, em linha com o que já vinham indicando algumas pesquisas do varejo e os índices de confiança levantados pela FGV juntos aos consumidores, o IBGE trouxe uma informação nada alentadora: o consumo das famílias ficou praticamente estagnado nos três primeiros meses do ano, repetindo o desempenho dos três últimos de 2012.
Além disso, a indústria continua vacilando, o que significa que desse lado também não se deve esperar muita coisa, especialmente na área do emprego. A boa, a melhor notícia, que Mantega, o Otimista, fez questão de ressaltar, é que os investimentos deram um salto – um bom sinal a ser confirmado para o longo prazo.
Mas o prazo presidencial é mais curto, tem data para acontecer: outubro de 2013, dia em que Dilma vai disputar a reeleição para a qual já botou todos os seus blocos na rua. E as armas dela, tirando os pequenos bodoques, são duas – duas faces de uma mesma moeda: o emprego em níveis baixos e a renda, que estão permitindo que a nova classe média, a classe média do Lula ou que classificação se queira dar a ela, consuma bens que nunca antes consumiu.
A questão para Dilma e para seus conselheiros políticos e de marketing é saber se com um PIB há tanto tempo tímido e dando sinais de que não vai sair desse ramerrame por ora, será possível sustentar o sentimento de satisfação que boa parte da população brasileira exibe neste momento. É possível segurar renda, emprego e consumo nessas condições até outubro de 2013, ainda mais que um outro monstro insidioso está à espreita, a inflação? Como fazer isso?
Nos últimos meses, aliás, praticamente durante todo o governo Dilma, o Ministério da Fazenda, cujo titular de fato, segundo Brasília inteira sabe, é mesmo a presidente, fez de tudo e um pouco mais para colocar o PIB nacional em um rabo de foguete. Foram contabilizados na ponta do lápis 18 pacotes, ora de incentivo direto ao consumo, ora de incentivo a alguns setores econômicos. Quase um a cada dois meses. Sem resultados, pelo que se vê.
Mesmo alguns dos economistas brasileiros mais respeitados –sem cargos oficiais mas que rezam pela cartilha do governo – já andam escrevendo e dizendo que é preciso mudar o que está aí – e que até agora só gerou inflação nervosa e PIB apático. Vai haver mudanças ou se insistirá em mais do mesmo? O samba enredo do “cordão dos otimistas inveterados” não está agradando.
Por José Márcio Mendonça